No caso da Síria, o presidente Barack Obama teria prejudicado a credibilidade de seu país ao não lançar, como esperavam apaixonadamente Paris e alguns estrategistas geniais, uma operação militar suplementar contra um Estado árabe. O termo escolhido por todos os papagaios é “credibilidade”


por Serge Halimi

Qualquer um pode dizer e escrever qualquer coisa. Em particular sobre os Estados Unidos. Em menos de seis meses, esse país acaba de passar do status de fênix que recuperou as plumas (retomada econômica, ressurreição da indústria automobilística) para o de império decadente, diminuído pelo comportamento sem força de vontade de seu presidente.1
Agora, dissertar sobre o tema da impotência norte-americana se tornou comum. No caso da Síria, o presidente Barack Obama teria prejudicado a credibilidade de seu país ao não lançar, como esperavam apaixonadamente Paris e alguns estrategistas geniais, uma operação militar suplementar contra um Estado árabe.2 O termo escolhido por todos os papagaios é “credibilidade”.
Então vejamos... A Guerra do Vietnã foi decidida por John Kennedy e por Lyndon Johnson sob o pretexto de impedir a queda de um “dominó” a mais na carteira comunista, soviética ou chinesa. Para os Estados Unidos, tratava-se de uma questão de credibilidade. Dois milhões de indochineses morreram. Quatro anos depois da derrota de Washington, Pequim e Hanói se enfrentaram militarmente...
Concebida por George W. Bush, a Guerra do Iraque deveria punir um regime acusado de pertencer, como o Irã e a Coreia do Norte, ao “Eixo do Mal”. Para os Estados Unidos, tratava-se de uma questão de credibilidade. Hoje, o Iraque está destruído e o poder instalado em Bagdá pelos soldados norte-americanos nunca foi tão próximo de Teerã.

“Não sou contra todas as guerras, mas me oponho a uma guerra estúpida”, explicou em outubro de 2002 um jovem senador chamado Barack Obama, hostil à aventura iraquiana de seu país. Eleito presidente, ele intensificou, no entanto, uma “guerra estúpida” no Afeganistão, antes de ter de bater em retirada.
No caso da Síria, os partidários da guerra lhe pediram que se recompusesse. Ele deveria ao mesmo tempo violar o direito internacional recorrendo à força sem a autorização do Conselho de Segurança, negligenciar a opinião do Congresso, depois, uma vez que a Casa Branca tivesse solicitado, ignorá-lo caso ele se opusesse e, por fim, lançar uma operação militar com o apoio de um número de aliados infinitamente menor do que a “coalizão dos voluntários” de Bush em 2003. Melhor, o presidente dos Estados Unidos estaria obrigado a começar essa aventura contra a vontade da maioria de seus concidadãos, dos quais alguns não têm dúvidas de que o Exército norte-americano vai se tornar na Síria a “aviação da Al-Qaeda”.3
Obama hesitou. Depois parece que concluiu que sua credibilidade sobreviveria sem penas à recusa de iniciar uma nova “guerra estúpida” no Oriente Médio.

Serge Halimi é o diretor de redação de Le Monde Diplomatique (França).

Ilustração: Pablo Lobato


1 Ler “Malaise à Washington. En 1952, déjà” [Mal-estar em Washington. Já em 1952], Le Monde Diplomatique, nov. 2008. Em “Les États-Unis saisis par le polycentrisme” [Os Estados Unidos tomados pelo policentrismo] (L’Atlas du Monde Diplomatique, 2012), Benoît Bréville analisa também o caráter repetitivo do tema do declínio norte-americano.
2 Ler também Mathias Reymond, “Conflit en Syrie: les éditocrates s’habillent en kaki” [Conflito na Síria: os editocratas vestem cáqui], Acrimed, 23 set. 2013. Disponível em: <www.acrimed.org>.
3 Segundo a expressão do antigo deputado de esquerda de Ohio, Dennis Kucinich.


Le Monde Diplomatique Brasil

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