![]() |
| Crédito da foto: Rede Brasil Atual |
Não importa se 54 milhões de pessoas elegeram Dilma. Se essa elite quer implementar o programa Uma Ponte para o Futuro, aplica um golpe e pronto. Por meio da farsa do século, o golpe é efetivado, troca-se o governo, e o programa derrotado nas urnas se torna o programa do governo golpista
Para elaborar esse documento, não teve nenhum trabalho, já que fez uma mera compilação das propostas das candidaturas do PSDB, derrotadas nas urnas nas quatro últimas eleições. A essência é exatamente a mesma! E se esse documento fosse novamente colocado em votação, seria novamente derrotado.
Mas a elite brasileira continua achando que o voto dos pobres não vale (como explicitou FHC na última campanha, ao referir-se ao “voto dos grotões”). Não importa se 54 milhões de pessoas elegeram Dilma. Se essa elite quer implementar o programa supracitado, aplica um golpe e pronto. Por meio da farsa do século, o golpe é efetivado, troca-se o governo, e o programa derrotado nas urnas se torna o programa do governo golpista.
O raciocínio desse governo golpista é horrivelmente coerente, em sua crua incoerência: como o povo não o elegeu, ele se acha no direito de não respeitá-lo; de não respeitar seus anseios e pleitos. Uma agenda inúmeras vezes rechaçada e derrotada pelo povo é violentamente imposta, de cima para baixo.
E o nome do documento é bastante simbólico. A “Ponte para o Futuro” revela de forma muito clara o desejo maior de Temer e de sua trupe: construir uma sociedade lá no alto, alheia a tudo o que se passa aqui embaixo. Lá de cima, eles se acham no direito de fazer o que querem e não precisam sequer olhar para aquilo que consideram como lixo: o povo brasileiro.
E essa ponte, além de alta, tem inúmeras barreiras. Desde logo, ela foi construída com acesso muito restrito às mulheres. Não apenas a presidenta Dilma foi expulsa, como todas as demais mulheres, com a composição de um ministério interventor que é formado exclusivamente por homens. O falso-presidente deixa evidente que as únicas mulheres bem-vindas são as belas, recatadas e do lar, como a falsa-primeira dama.
A ponte também não é acessível aos negros, como revela a mesma foto dos ministros-interventores. Aliás, entre os apoiadores desse governo branco, há alguns que defendem explicitamente que o lugar do negro continua sendo a senzala. Afinal, o que significa a tentativa de flexibilização da legislação relativa à caracterização do trabalho escravo, senão o intuito de mantê-los em suas fazendas?
A ponte também não é para os artistas que, percebendo isso, mantêm ocupações em diversas cidades do país com a pauta irrevogável do “Fora Temer”. As declarações de Feliciano mostram a visão (ou falta dela…) sobre a cultura e o trabalho dos artistas, alegando que com o fechamento do Ministério da Cultura, os artistas finalmente teriam que procurar o Ministério do Emprego.
A ponte não é para os aposentados, já que o documento deixa clara a intenção de desvincular os reajustes das aposentadorias em relação àqueles do salário mínimo. Acostumados a salários altos, não percebem que milhões de famílias brasileiras sobrevivem graças à aposentadoria rural – ou a aposentadorias de um salário mínimo. De fato, as declarações do novo interventor da Fazenda, Henrique Meirelles, mostram o risco de um retrocesso também nos direitos dos idosos já aposentados. Afinal, se isso foi feito na Grécia – com consequências catastróficas! –, por que não poderia ser feito também aqui nos trópicos?
Mas, sobretudo, a ponte não é para os trabalhadores. Sem nenhum pudor, o documento anuncia a piora expressiva das condições de vida da classe trabalhadora. Para começar, propõe a destruição da CLT, que ficaria subordinada às decisões dos acordos coletivos. Como se não bastasse essa flexibilização do mercado de trabalho, propõe que o salário mínimo não tenha mais nenhuma regra de reajuste! A definição sobre seus reajustes ficaria a cargo do Congresso (e que Congresso!).
Defende, ainda, a desvinculação dos gastos obrigatórios com saúde e educação, que resultará em acelerado sucateamento dos já problemáticos serviços públicos nessas áreas. Uma vez que isso se configure, ficará mais fácil acelerar o processo – também previsto no documento – de privatizações e de ampliação da participação do setor privado nesses setores – aprofundando o processo de transformação de direitos em mercadorias.
Essa é a ponte. E esse é o futuro proposto. Lá no alto dessa ponte de homens brancos e ricos, o governo golpista desfila e mostra claramente a que veio. Lá do alto, caem dia a dia as máscaras da pseudo-luta anticorrupção – até mesmo do interventor do novo “Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle”, um nome tão pomposo quanto mentiroso.
Lá do alto, Romero Jucá nos chama de idiotas. Depois de divulgada sua conversa com Machado, em que esclarece de forma nítida – até mesmo didática – as razões por trás do golpe e o procedimento adotado, grita lá de cima que se afasta do governo para evitar “manifestações babacas”. Como um animal acuado, se defende atacando e xingando o conjunto da população brasileira.
Lá do alto, esse governo golpista despeja toda sua raiva e desprezo em relação ao povo brasileiro, gritando impropérios e atacando direitos.
Mas nada é tão assombroso que não possa piorar. Além dos xingamentos que já estamos recebendo, em breve receberemos também balas de borracha e bombas de efeito moral. Afinal, se Alexandre de Moraes permitiu a invasão da PM às escolas de São Paulo para retirar à força jovens secundaristas – e depois os levou a delegacias comuns, antecipando ilegalmente seu próprio pleito de redução da maioridade penal –, imaginem como será o tratamento aos movimentos sociais…
Mas o que esses golpistas não percebem é que não haverá ponte possível. Inspirando-se nos seus grandes gurus, os golpistas militares de outrora, Temer pode tentar construir pontes altas e protegidas. Pode até construir uma ponte que dê acesso direto a Washington-DC, Londres ou Bruxelas – sem passagem pela América Latina e pela África –, como quer Serra.
No entanto, ainda que se julguem imunes ao que vem de baixo, esse governo golpista verá e ouvirá a reação. Verá e ouvirá que debaixo dessa ponte mora muita gente. Gente com vontade, com anseios políticos e com inteligência para perceber o engodo. Ainda que a validade de seu voto lhes seja sumariamente retirada, resta a voz para gritar de volta e acusar o golpismo. Restam as pernas, para invadir as ruas e clamar pelo fim desse governo ilegítimo. Resta a força e a coragem para, coletivamente, derrubar os alicerces dessa ponte que nos é estranha, que não queremos e que não aceitaremos. Mostraremos a Temer e à sua corja que os rumos do nosso país serão decididos aqui embaixo e não lá em cima.
Brasil Debate

Postar um comentário
-Os comentários reproduzidos não refletem necessariamente a linha editorial do blog
-São impublicáveis acusações de carácter criminal, insultos, linguagem grosseira ou difamatória, violações da vida privada, incitações ao ódio ou à violência, ou que preconizem violações dos direitos humanos;
-São intoleráveis comentários racistas, xenófobos, sexistas, obscenos, homofóbicos, assim como comentários de tom extremista, violento ou de qualquer forma ofensivo em questões de etnia, nacionalidade, identidade, religião, filiação política ou partidária, clube, idade, género, preferências sexuais, incapacidade ou doença;
-É inaceitável conteúdo comercial, publicitário (Compre Bicicletas ZZZ), partidário ou propagandístico (Vota Partido XXX!);
-Os comentários não podem incluir moradas, endereços de e-mail ou números de telefone;
-Não são permitidos comentários repetidos, quer estes sejam escritos no mesmo artigo ou em artigos diferentes;
-Os comentários devem visar o tema do artigo em que são submetidos. Os comentários “fora de tópico” não serão publicados;