É uma “sapateada” em cima dos economistas e dos jornalistas que embarcaram na bobagem de dizer que a culpa da queda do valor do frete – e, portanto, as dificuldades dos caminhoneiros – era fruto de uma política perdulária de subsídios a compra de caminhões novos no governo.



Quem faz a dança da verdade é a economista Laura Carvalho, em sua coluna na Folha, em que mostra que o “pico” de aquisição de veículos de carga aconteceu em 2011 por uma razão nada irresponsável: a aplicação da obrigatoriedade prevista muitos anos antes – nos governos´Sarney, Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso, de que os veículos de carga passassem a ser fabricados para o uso de combustíveis menos poluentes, o que levou a um aumento da substituição de veículos, uma vez que a mudança exige adaptações nos motores diesel mais antigos.

Com dados do economista Bráulio Borges, da LCA Consultores, no blog do Ibre-FGV, Laura mostra que o aumento nos pedidos e concessões de financiamentos do PSI – Programa de Sustentação do Investimento, do BNDES – ocorreu justamente em 2011, às vésperas da entrada em vigor do acordo judicial que estabeleceu, em 2009, que em 1° de janeiro de 2012 se adotaria o combustível P-7, equivalente ao padrão Euro 5, norma da União Europeia para emissão de gases.

O gráfico aí de cima, elaborado pela MAN, divisão de caminhões da Volkswagen, mostra a cronologia das mudanças no diesel e o grau absurdo de redução de óxidos de nitrogênio e de emissão de partículas (material particulado, MP) gerados pela mudança.

Não foi o crescimento em excesso da frota de caminhões, mas o encolhimento da demanda por transporte de carga, com a crise, que provocou a queda nos valores de frete.

É curioso e trágico que as bobagens que foram ditas por ódio político saiam de boca que, inclusive, defende a responsabilidade ambiental ao criticar a primazia no caminhão no modelo de logística brasileiro.

Abaixo, o texto de Laura, que fez o jornalismo que a imprensa não quis fazer.


Subsídio à compra de caminhões não causou a crise

Laura Carvalho, na Folha
Entre os principais suspeitos na busca de explicações econômicas para a paralisação dos caminhoneiros, estão desde medidas tomadas pelo atual governo, como o excesso de volatilidade no repasse dos preços internacionais de combustíveis ao mercado doméstico, a problemas estruturais da economia brasileira, como a alta tributação sobre o consumo, a fragilidade de nossa malha ferroviária ou a alta dependência de combustíveis fósseis, por exemplo.
Mas uma medida do governo anterior também vem sendo alvo de investigações.
Após responsabilizar ao vivo, no Bom Dia Brasil, os subsídios realizados pelo BNDES sob o governo Dilma pela compra excessiva de caminhões e pela queda no valor do frete, o jornalista Alexandre Garcia causou furor nas redes sociais, tornando-se “trending topic” no Twitter na segunda-feira (28).
A interpretação, que havia sido introduzida na coluna “Comédia de erros”, de Samuel Pessôa, publicada nesta Folha em 27/5, também tornou-se pauta de reportagem publicada no domingo (3).
Na primeira frase da reportagem, lê-se que “as facilidades que inflaram a frota de caminhões do país vieram com o Programa de Sustentação do Investimento (PSI)”. Não é o que sugerem os números apresentados pelo economista Bráulio Borges, da LCA Consultores, no blog do Ibre-FGV.
Primeiro porque, lembra o economista, a expansão de 8,3% na frota de caminhões em 2011 —a maior da série histórica— deu-se pela exigência estabelecida quase dez anos antes de que todos os veículos movidos a diesel produzidos no Brasil adotassem motores compatíveis com o protocolo Euro 5 a partir de janeiro de 2012.
Como já se sabia que a nova tecnologia, que reduz entre 60% e 70% as emissões de diversos tipos de gases nocivos à saúde e ao ambiente, seria mais cara, a renovação das frotas de ônibus e caminhões acabou sendo antecipada no ano anterior.
A consequência foi uma queda de 19% dos licenciamentos e de 38% na produção de caminhões e ônibus em 2012. Foi nesse contexto de contração do mercado que o governo abriu, em setembro, uma nova linha de financiamento subsidiada pelo BNDES com juros nominais de 2,5% ao ano.
Ainda que tenha havido alguma recuperação no número de licenciamentos em 2013, o patamar ainda fica abaixo do observado em 2010 e 2011. Além disso, mesmo com os subsídios do PSI, só cerca de 30% da frota circulante atual foi comprada entre 2012 e 2017 e adequa-se, portanto, à tecnologia Euro 5.
Para além das questões ambientais, Borges apresenta dados das Tabelas de Recursos e Usos do IBGE para mostrar que os setores que mais utilizam transporte de cargas rodoviárias (e.g. indústria de transformação, comércio e agropecuária) cresceram acima da média da economia entre 2007 e 2014 e muito abaixo durante a crise de 2015-2017.
Ainda assim, o preço dos fretes, que havia subido entre 2011 e 2013, se manteve no período 2014-2016 em nível semelhante ao observado em 2010-2011.
O que essas evidências indicam é que não houve excesso significativo de oferta de caminhões na economia nesse período.
Como aponta Borges, “se assim fosse, os preços reais dos fretes deveriam ter recuado expressivamente”. O que houve foi um recuo da demanda em razão da crise, que prejudicou desproporcionalmente o setor de transporte de cargas.
O Brasil ganharia muito se, em vez de implementar soluções paliativas e custosas para reduzir o prxxeço de combustíveis fósseis em meio à crise, nós nos dedicássemos a desenhar um programa de investimentos públicos voltados ao crescimento econômico sustentável.


TIJOLAÇO

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