“Amordaçar testemunhas é um sinal claro que não está se fazendo justiça”, disse hoje o advogado Rodrigo Tacla Durán, em texto que leu antes de depor à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.
Tacla Durán já tinha sido ouvido anteriormente, na CPMI da JBS, em 30 de novembro de 2017.
Ele trabalhou como advogado para a Odebrecht entre 2011 e 2016.
No Brasil, responde a acusações de lavar dinheiro no âmbito da Operação Lava Jato, mas não reconhece a jurisdição brasileira por viver em Madri, na Espanha.
A Justiça espanhola negou a extradição do advogado.
Tacla Durán configura a maior ameaça à Lava Jato e, especialmente, ao acordo de delação de 77 executivos da Odebrecht, que sustenta a abertura de dezenas de inquéritos contra políticos, inclusive Michel Temer e o ex-presidente Lula.
Durán contou aos deputados que já respondeu a três oitivas do Equador, uma de Andorra, uma da Suiça, uma de Antigua e Barbuda, uma do México, uma do Peru, uma da Argentina e uma do Brasil.
No caso da oitiva solicitada pelo Ministério Público Federal, marcada para 4 de dezembro de 2017, na presença de um juiz e de um procurador espanhóis, Tacla Durán compareceu mas os procuradores brasileiros simplesmente não foram — dentre eles, Roberson Henrique Pozzobon e Orlando Martello Jr.
O MPF não explicou o motivo da desistência.
Àquela altura, Tacla Durán já havia feito as denúncias de corrupção na Lava Jato à CPMI da JBS.
Uma delas é de que Carlos Zucolotto Junior, compadre do juiz Sérgio Moro, queria tirar vantagem financeira de sua delação, que Zucolotto ajudava a negociar.
Como prova, além da troca de mensagens com Zucolotto, Durán mostrou à CPMI minuta do acordo que negociava com o MPF na qual a multa a ser paga por ele seria diminuída. Em troca, Zucolotto embolsaria R$ 5 milhões.
Tanto Moro quanto a esposa dele, Rosângela, que já trabalhou no escritório de Zucolotto, sairam publicamente em defesa do amigo.
FURA BOLHA
Tacla Durán denuncia que a delação premiada da Odebrecht foi organizada de forma a preservar a empresa, executivos da empresa e eventualmente autoridades que foram corrompidas pela empreiteira.
Os 77 delatores da empreiteira receberam a garantia de que vão receber salários nos próximos 15 anos.
Segundo Tacla Durán, o sistema Drousys, de comunicação interna da Odebrecht — troca de e-mails, chat e voip — foi adulterado antes e depois que foi apreendido, com o objetivo de suprimir informações.
O Drousys estava abrigado em servidores da Suiça e posteriormente foi transferido para a Suécia.
Da mesma forma, de acordo com Durán, houve manipulação do sistema MyWebDay, que registrava as transações financeiras da Odebrecht.
Um dos objetivos teria sido o de apagar registros de que executivos da própria Odebrecht desviavam dinheiro da empresa.
De acordo com Tacla Durán, isso aconteceu no Meinl Bank, de Antigua, que funcionava como uma espécie de caixa dois da empreiteira.
O advogado denuncia vantagens concedidas pelo MPF aos executivos Luiz Augusto França, Marco Bilinski e Vinicius Borin: apesar de movimentaram U$ 2,6 bilhões no Meiln Bank, eles se livraram das acusações mais graves, receberam pena máxima combinada de 8 anos em regime fechado e pagaram multa que somou apenas R$ 3,4 milhões.
Além disso, poderiam fazer até seis viagens internacionais durante o cumprimento da pena, desde que com autorização judicial.
Durán sugere que, nas viagens, os executivos teriam a oportunidade de apagar rastros e fazer outras operações em defesa de interesses pessoais ou da empresa.
CHANTAGEM E PROSTITUTAS
No depoimento, Tacla Durán confirmou que a Odebrecht utilizava garotas de programa, em viagens fora do Brasil, para permitir que beneficiários do dinheiro da empreiteira fossem chantageados.
Segundo ele, um dos operadores deste esquema era Fernando Migliaccio, ex-executivo da empresa.
Durán esclareceu a anotação “efeito Bisol”, encontrada no celular do dono da empreiteira, Marcelo Odebrecht.
Segundo ele, o termo diz respeito a chantagem que teria sido feita contra o ex-senador petista José Paulo Bisol, quando da criação da CPI das Empreiteiras, em 1994.
A CPI nunca foi instalada.
PANELA DE CURITIBA
Tacla Durán também reafirmou suas denúncias contra a chamada “panela de Curitiba”, que envolveria escritórios de advocacia e procuradores da Lava Jato em acordos informais.
Seria a “indústria da delação premiada”, oferecendo vantagens em troca de denúncias específicas ou mesmo arquivando delações.
Para Durán, embora delatados e alvos da Operação Câmbio, Desligo, a Lava Jato em Curitiba não se ocupou até agora de denunciar o chamado “doleiro dos doleiros”, Dario Messer — e seus associados — no Paraná.
Messer está foragido.
Como lembrou o colunista Jeferson Miola, o “sumiço” de Messer é suspeito:
A fuga e o desaparecimento de Dario Messer adquire ainda maior relevância e valor investigativo depois da denúncia feita por doleiros acerca da existência de esquema mafioso mediante o qual o advogado Antônio Figueiredo Basto recebia US$ 50 mil dólares mensais como “taxa de proteção” para garantir que “eles [doleiros] seriam poupados nas delações decorrentes do caso Banestado, que correu na jurisdição de Sergio Moro”.
Em seu depoimento, Tacla Durán fez uma conta: considerando que Messer e quatro de seus associados teriam sido protegidos desde 1996 por Figueiredo Basto, o esquema poderia ter rendido ao advogado U$ 25 milhões.
“Nenhum deles foi processado em Curitiba”, lembrou Tacla Durán durante o depoimento, sugerindo que o esquema de proteção de Messer, originário do escândalo do Banestado, de fato funcionou.
O advogado Antônio Figueiredo Basto é um dos acusados por Durán de fazer parte da “panela de Curitiba”.
Tacla Durán também estranhou que, apesar de delações feitas pelos executivos Benedito Jr. e Henrique Valadares, da Odebrecht, não houve investigação do jornalista Diogo Mainardi — que teria testemunhado um ato de corrupção — e das empresas PVR Marketing e Propaganda e Empiricus, que teriam sido beneficiárias de dinheiro da empreiteira.
Segundo ele, é a prova das chamadas delações “a la carte”.
Viomundo