Recorte da imagem tirada por Diego Padgurschi /Folhapress
“…que la bouche qui prononce les paroles de la loi, des êtres inanimés qui n’en peuvent modérer ni la force ni la rigueur.” (EL, XI, 6)
Na minha edição brasileira dessa obra, o fragmento que contém essa famosa passagem foi assim traduzido:
“Mas os juízes da nação são apenas, como dissemos, a boca que pronuncia as palavras da lei; seres inanimados que não podem nem moderar a força nem o rigor dessas palavras.” (Do Espírito das Leis, Montesquieu, Martin Claret, São Paulo, 2011, p. 175)
A expressão seres inanimados mencionada neste fragmento remete diretamente àquilo que Montesquieu havia dito anteriormente sobre a distinção entre o Conselho do Rei e o Tribunal de Judicatura. No primeiro, os casos deveriam ser decididos de acordo com a paixão (ou seja, a orientação política).
“Nos tribunais de judicatura, pelo contrário, é preciso serenidade e que para tais juízes os processos sejam, de certa forma, indiferentes”. (Do Espírito das Leis, Montesquieu, Martin Claret, São Paulo, 2011, p. 96)
O que Montesquieu chamou de indiferença nós chamamos de imparcialidade (artigo 254, IV do Código de Processo Penal, arts. 7º e 139, I, do CPC). Esse instituto processual que assegura o devido processo legal (art. 5º, LIV e LV, da CF/88) pode ser considerado um desdobramento processual do princípio da impessoalidade que deve orientar a atividade estatal (art. 37, caput, da CF/88).
Além de conversar com o órgão de acusação fora dos autos, aconselhando-o como proceder em relação a um suspeito (Lula), Sérgio Moro demonstrou não ser nada indiferente ao apoio de outro réu em potencial (FHC) que poderia ajudá-lo a levar o ex-presidente petista para a prisão. A conduta dele seria considerada repugnante por Montesquieu.
Levando em conta a obra do filósofo francês, podemos seguramente dizer que o juiz lavajatiano moderou o rigor da lei em relação a um réu (o aliado em potencial que ele não queria melindrar) porque não lhe era indiferente o destino do suspeito que ele pretendia condenar e prender (com a ajuda de FHC). Além de não atuar com a serenidade própria dos Tribunais de Judicatura, Sérgio Moro agiu apaixonadamente como se fosse o membro de um Conselho Real.
No âmbito da Lava Jato FHC foi considerado um rei absolutamente irresponsável porque o juiz se considerou um súdito dele?
No Senado Federal, o herói/vilão lavajateiro sugeriu que ao condenar Lula ele agiu como La bouche de la loi. A boca de Sérgio Moro para dizer a Lei, entretanto, se tornou corrompida no momento exato em que ele conspirou para condenar um suspeito com ajuda do réu que ele pediu para o MPF não denunciar. Ele deixou de agir como um ser inanimado e se tornou um escravo da paixão persecutória que revelou a Deltan Dellagnol.
A Lei brasileira é absolutamente clara. A decisão proferida no caso do Triplex é inevitavelmente nula. E não adianta agora uma boca corrompida da Lei querer legitimar seus atos atacando o The Intercept. Aliás, quem garante ao website do jornalista norte-americano o direito de informar o público não é Sérgio Moro e sim a Constituição Federal que ele deliberadamente deixou de cumprir ao não se declarar suspeito para julgar Lula.
GGN

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