Acatar o pedido do MP não significaria reconhecer o processo "vil" a que foi submetido, sugere o professor de Direito Constitucional da PUC-SP. "O país precisa de Lula falando"

Publicado por Tiago Pereira, da RBA
Publicado por Redação RBA

Ricardo Stuckert
"Lula deve sair de cabeça erguida, sabendo que o país precisa das palavras dele", afirma o jurista


São Paulo – Na avaliação do jurista Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva deve aceitar a progressão para o regime semiaberto. O pedido, assinado pelos 15 membros da força-tarefa da Operação Lava Jato, tendo o procurador Deltan Dallagnol à frente, foi encaminhado à Justiça Federal na última sexta-feira (27).

Segundo ele, no plano jurídico, é um pedido absolutamente correto, já que Lula cumpriu 1/6 da pena e tem direito à progressão para o regime semiaberto, quando trabalharia durante o dia e dormiria na prisão – ou ainda em prisão domiciliar, com tornozeleira, podendo também trabalhar e sair livremente durante o dia, e se recolhendo à noite e nos finais de semana.

“Como advogado, aconselharia a usufruir desse direito. Não tem nada a ver com reconhecer culpa, nem a legitimidade desse julgamento vil. Quanto menos restrições sofrer no seu direito de liberdade, melhor. Menos agressão tirânica há em relação aos seus direitos”, afirmou Serrano aos jornalistas Glauco Faria e Jô Miyagui, em edição especial do Jornal Brasil Atual, neste sábado (28).

No plano político, o pedido é absolutamente “inusitado”, segundo Serrano, já que caberia à defesa de Lula fazê-lo, e revela um recuo dos agentes da Lava Jato diante das revelações trazidas pela Vaza Jato e da iminente mudança de postura do Supremo Tribunal Federal (STF) em relação aos abusos cometidos pelos procuradores, em conluio com o então juiz Sério Moro.

“No plano jurídico, aconselharia ele a sair. No plano político, também, porque fora da cadeia Lula ele pode falar, dar entrevistas e estar mais presente na vida nacional. O país precisa de Lula falando. O país está entrando num caminho absolutamente sem sentido”, diz o jurista, que cita as confissões do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, que revelou ter ido armado à uma sessão do Supremo Tribunal Federal (STF) com a intenção de matar o ministro Gilmar Mendes.

“O país está uma bagunça, está sem ordem. Lula pode significar a retomada de um caminho ordeiro, moderado e de progresso. Ele falando orienta as pessoas, o país. Ele tem uma imensa e singular capacidade de liderança”, defende. “Esses homens, sem querem, estão fazendo um favor para o país. Lula deve sair de cabeça erguida, sabendo que o país precisa das suas palavras. Ele precisa estar em casa para poder falar ao povo. O povo precisa de direção nesse momento. Nossas instituições, nossos homens de liderança, se deixaram vender para a mídia, para a vaidade, em nome de interesses pessoais, e realizaram um caos nesse país, desde o impeachment da Dilma, e nós não estamos conseguindo colocar o país nos trilhos”, afirma Serrano.

Direitos Políticos

Para Serrano, quando libertado, Lula poderá falar e opinar livremente, como qualquer cidadão. Qualquer restrição aos seus direitos políticos seria “inconstitucional”, segundo ele, e seguiria para as instâncias superiores. “Não se pode querer calar a voz do Lula nesse momento. Seria uma perda imensa para o país e uma imensa agressão à Constituição. Tenho certeza que se os juízes de Curitiba resolverem dar mais essa ajuda ao golpe, mais esse tipo de solapamento à democracia e à Constituição Brasileira, os tribunais superiores vão derrubar esse tipo de limitação.”

Atibaia

O jurista diz, ainda, que o conluio político entre Moro e os procuradores, comprovado e evidenciado pelos conversas reveladas pelo The Intercept Brasil, também contaminam o processo em que Lula é acusado de ter sido o beneficiário de obras realizadas pelas empreiteiras Odebrecht e OAS num sítio em Atibaia. “Foram várias fraudes armadas por procuradores que se relacionavam de forma absolutamente ilícita e politizada com o juiz. Como afirma (Luigi) Ferrajoli, um dos maiores juristas vivos do planeta, é estarrecedor a forma com que que as instituições brasileiras foram utilizadas para golpear Dilma, Lula e a democracia brasileira e a nossa constituição.”

Bode expiatório

Além da libertação do ex-presidente, especula-se que Dallagnol deverá ser punido disciplinarmente, ou ao menos removido da função de coordenador da Lava Jato. Serrano, contudo, ressalva que a “culpa” não deve cair exclusivamente sobre ele, como se fosse uma espécie de “bode expiatório”. Ele cobra que haja uma “Justiça de transição” para apurar as responsabilidades e punir os envolvidos que fizeram uso do sistema de Justiça para golpear a democracia brasileira.

“O erro da gente é se nós quisermos personalizar, colocando nele (Dallagnol) a culpa de tudo o que houve. Não é verdadeiro. Houve um sistema no país que funciona mal, que funcionou em favor das elites contra o povo, e que funcionou contra a democracia e contra a Constituição. Houve um enredamento de pessoas de vários setores sociais, capitaneado pelo sistema de Justiça e pela mídia comercial, que são os grandes responsáveis por isso. De nada adiantaria Deltan ter feito o que fez, se não tivesse apoio do Judiciário, o apoio incisivo do juiz Moro, que é o verdadeiro líder desse processo nefasto. O apoio de parte do Supremo Tribunal Federal (STF), de parte do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de parte significativa do Tribunal Regional Federal da 4ª região (TRF4), que chegou a decidir dar poderes de exceção para Moro, declaradamente. É o único tribunal no mundo fez isso.”


Rede Brasil Atual

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