Foto reprodução do twitter

Assessores do presidente Jair Bolsonaro chegaram a anunciar que ele teria um encontro, talvez um jantar em Nova York com Donald Trump.

Não aconteceu.

Não foi desprezo pelo brasileiro.

Trump sabia do vendaval que se avizinhava.

Ele sabia que os democratas estavam se preparando para formalizar o início de investigações que podem resultar no impeachment do presidente dos Estados Unidos.

O motivo?

Uma ligação telefônica ao então recém-eleito presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, na qual Trump pressionou o mandatário a trabalhar com o procurador-geral dos Estados Unidos, William P. Barr, para fazer investigações.

Um dos alvos seria Joe Biden, pré-candidato democrata à Casa Branca.

O filho de Biden, Hunter, é advogado, lobista e sócio de uma empresa de consultoria de nome Rosemont Seneca Partners.

Joe Biden serviu como vice-presidente dos Estados Unidos durante dois mandatos sob Barack Obama, até janeiro de 2017.

O GOLPE DE 2014

Em fevereiro de 2014, o presidente pró-Rússia da Ucrânia, Viktor Yanukovytch, foi derrubado por uma “revolução colorida”, um golpe pró-ocidental com as impressões digitais da CIA.

Por coincidência, naquele ano o filho de Joe Biden começou a trabalhar para uma empresa que produzia gás natural na Ucrânia — posição que manteve até este ano.

Há alguns meses, Joe Biden foi acusado de ter usado seu poder político para demitir um promotor ucraniano que investigava os negócios de Hunter e da empresa para a qual ele trabalhava na Ucrânia, a Burisma Holdings.

A ligação telefônica de Trump para Zelensky, em 25 de julho deste ano, chamou a atenção de uma autoridade de inteligência dos Estados Unidos.

Essa pessoa, ainda não identificada, fez uma reclamação formal contra Trump.

Ela não estava presente durante a ligação de Trump. Pode ter lido as notas taquigráficas ou ouvido falar delas.

As notas são feitas enquanto os dois presidentes conversam e vão para o arquivo marcadas como segredos de Estado.

As notas foram tornadas públicas por Trump como forma de se antecipar às investigações.

Quem denunciou a conversa tornou-se um whistleblower, um apitador, um denunciante.

A denúncia, antes de se tornar pública, foi enviada ao inspetor geral da comunidade de inteligência, que deveria encaminhá-la automaticamente ao Congresso.

Porém, o Departamento de Justiça (o Moro dos Estados Unidos) opinou no meio do caminho: a denúncia era irrelevante e deveria ser arquivada.

Quando o assunto tornou-se público, o Senado votou por unanimidade para que a denúncia do apitador fosse submetida ao VAR: o Comitê de Inteligência do Senado.

A denúncia do apitador, mais a transcrição do telefonema, demonstram que Trump pediu a um líder estrangeiro que fizesse uma investigação de interesse dele.

Apoiadores de Trump dizem que ele não foi específico.

Democratas dizem que, pelo contexto geral, Trump queria fazer uma troca: liberar o dinheiro para a Ucrânia em troca da investigação que prejudicasse democratas, Biden especificamente.

Dias antes da ligação, ele tinha congelado U$ 400 milhões em ajuda à Ucrânia.

Chama a atenção o fato de que Trump pediu um favor ao presidente eleito, assim mesmo, a favor, logo depois de Zelensky ter falado em comprar mais mísseis anti-tanque Javelin dos Estados Unidos, o que dependeria de autorização de Trump.

Como se sabe, o regime de Kiev enfrenta uma guerra civil com rebeldes sustentados pela Rússia.

Ao longo da conversa, Donald Trump se refere várias vezes a seu advogado pessoal, o ex-prefeito de Nova York, Rudolph Giuliani.

O HOMEM DA MACHADINHA

Giuliani é uma espécie de homem da machadinha de Trump.

Um faz tudo.

É o homem que resolve coisas que Trump não poderia resolver oficialmente na Casa Branca, por questões legais.

Curiosamente, foi quem encontrou com Jair e Eduardo Bolsonaro em Nova York, na ausência do patrão.

Na oportunidade, Giuliani fez rasgados elogios a Bolsonaro.

“Bolsonaro é um homem extraordinário e o Brasil tem muita sorte em tê-lo”, disse Giuliani a repórteres.

“Eu o vejo como um líder para a América do Sul”, afirmou o ex-prefeito de Nova York, depois do encontro privado com o presidente e o futuro embaixador do Brasil em Washington.

Giuliani, no entanto, pode estar enrolado.

Ele será um dos alvos na investigação de Donald Trump.

Giuliani pode ser para Trump o que foi Bob Haldeman para Richard Nixon.

Nixon foi o presidente dos Estados Unidos que renunciou em 1973 para não ser cassado pelo Congresso.

Haldeman ocupava um cargo formal na Casa Branca: chefe da Casa Civil.

Foi ele quem ouviu calado o pedido de Nixon para colocar pressão no FBI e interromper a investigação do escândalo de Watergate.

Watergate é o nome de um prédio em Washington, a capital dos Estados Unidos, onde ficava a sede do Partido Democrata.

Assessores de Nixon, do Partido Republicano, organizaram um furto à sede dos rivais para obter informações sigilosas.

Nixon e sua turma tentaram abafar o escândalo.

Haldeman foi condenado por perjúrio, conspiração e obstrução de Justiça. Passou 18 meses na cadeia.

Haldeman não era um dos plumbers de Nixon, um dos fixers, um dos “encanadores” do chefão.

Giuliani está mais para esta função: um operador, o cara que atua no limite legal, que manda o recado, que assume o que o capo não pode assumir.

Por isso, tudo o que ele disser aos Bolsonaro deve ser levado muito a sério. Vem da suíte presidencial.

A situação legal de Giuliani não é tão grave, hoje, porque ele não tem cargo no governo.

Mas depois de Donald Trump ele certamente será o primeiro alvo.

As perguntas que já estão circulando sobre o “novo” grande amigo de Jair e Eduardo Bolsonaro:

— Giuliani tentou obter alguma coisa de valor para Trump — como informação que poderia ferir um opositor político — de uma fonte estrangeira, em violação da lei eleitoral?

— Ele se envolveu em suborno ao sugerir que algo de valor — como ajuda militar à Ucrânia — seria dado em troca da investigação da família Biden?

— Ele se envolveu numa questão de política externa dos Estados Unidos como cidadão privado, o que é proibido pela Lei Logan?

— Ele pode ser definido como co-conspirador numa tentativa ampla de fraudar ou tentar interferir nas eleições presidenciais de 2020?

Por enquanto, tudo o que se tem contra Giuliani, além das menções feitas a ele na conversa telefônica entre Trump e o presidente eleito da Ucrânia, é uma cronologia constrangedora, publicada pelo diário britânico Guardian:

7 de abril: Giuliani acusa Biden de, enquanto vice-presidente dos Estados Unidos, pressionar pela demissão de um promotor da Ucrânia que investigava seu filho.

25 de abril: Biden lança sua campanha à Casa Branca

Primeiro de maio: Segundo o New York Times, Giuliani pressiona a Ucrânia a conduzir uma nova investigação sobre Joe e Hunter Biden e liga para Donald Trump para informá-lo a respeito.

10 de maio: Giuliani cancela viagem que faria à Ucrânia alegando que alguém poderia dizer que seria “impróprio” pressionar o presidente eleito.

20 de maio: Zelensky assume o poder.

25 de maio: Trump liga para Zelensky.

12 de agosto: Integrante da comunidade de inteligência denuncia a ligação de Trump ao presidente da Ucrânia.

21 de agosto: Giuliani revela que viajou para Madri e encontrou com Andriy Yermak, assessor de Zelensky, para pedir a ele que investigasse Joe e Hunter Biden. Afirma que viajou na condição de “cidadão privado”, mas que o encontro foi acertado por Kurt Volker, “representante especial” dos Estados Unidos em Kiev. Giuliani não contou se levou documentos obtidos pelos “encanadores” de Trump para entregar a Yermak.

9 de setembro: Democratas pedem informações à Casa Branca sobre qualquer tentativa de Trump de colocar pressão na Ucrânia para ajudar em sua reeleição. A carta acusa Trump e Giuliani de agirem por fora de “canais diplomáticos e policiais legais” (feito a Lava Jato, acrescenta o Viomundo).

13 de setembro: Adam Schiff, líder democrata do Comitê de Inteligência da Câmara, faz pedido formal para que a Casa Branca entregue a da reclamação feita pelo whistleblower. O diretor de inteligência nacional, indicado por Trump, se nega.

18 de setembro: O Washington Post revela que a reclamação do apitador se refere a um telefonema entre Trump e um líder estrangeiro.

19 de setembro: Em entrevista à rede CNN, Giuliani nega veementemente que tenha feito qualquer pedido à Ucrânia para investigar Joe e Hunter Biden. Trinta segundos depois, volta atrás: “Naturalmente, pedi”.


Viomundo

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