O superintendente do Ibama no Pará atropelou normas internas do órgão para liberar cinco cargas de madeira exportadas irregularmente para Estados Unidos, Bélgica e Dinamarca.
Walter Mendes Magalhães Junior é um policial militar paulista aposentado que até outubro passado nunca tivera nenhum contato com a área. Ele beneficiou uma empresa britânica chamada Tradelink ao emitir licenças de exportação retroativas, algo que não está previsto na lei. Dessa forma, legalizou o envio irregular de madeira da Amazônia ao exterior.



Walter Mendes Magalhães Júnior, à época major, em cerimônia em que foi condecorado pelo então governador Geraldo Alckmin: da Rota para o Ibama, sem experiência na área ambiental.
Foto: Denis Bonelli/SSP

Servidores do Ibama que conhecem o assunto e pediram para não serem identificados por temerem represálias disseram ao Intercept que foram surpreendidos pelo procedimento de Magalhães, que desrespeita o regulamento que o órgão deve seguir.

O caso ocorreu no início de fevereiro. As cinco remessas de madeira haviam saído do Brasil um mês antes, mas ficaram retidas em seus destinos por falta da autorização de exportação do Ibama.



No documento que escreveu e assinou para ajudar a Tradelink, Magalhães ainda acena com a possibilidade de estender o quebra-galho a outras empresas. “Informo que esta ação emergencial pode ser adotada a quaisquer empresas que estiverem em contexto semelhante, não se restringindo à empresa em questão”, escreveu, na Informação N° 21/2020, da superintendência do Ibama no Pará.

“Há indícios de que houve a exportação com violação da legislação em vigor. Entendo que houve violação à legislação em vigor. A lei é clara: precisaria das licenças para exportar, o que não ocorreu”, avalia a jurista Melissa Pilotto, professora de Direito Ambiental na Unicuritiba, no Paraná.
Os cinco contêineres enviados ao exterior irregularmente – lâminas de jatobá e ipê, cortadas para serem usadas em pisos, assoalhos e decks – somam quase 110 metros cúbicos e podem acarretar uma multa de R$ 33 mil à empresa. É madeira suficiente para construir 20 casas pequenas de madeira.

Uma norma do Ibama veda expressamente o que o superintendente fez. O documento é claro ao dizer que a exportação dos produtos e subprodutos madeireiros de origem nativa “dependerão de autorização do Ibama no local de exportação”. Dito de outra forma: o aval teria que ter sido dado antes das cargas terem deixado o Brasil.

A legislação ambiental em vigor prevê pena de um a três anos de prisão e multa para o funcionário público que conceder “autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais”. Um decreto que estipula sanções administrativas em caso de desrespeito às normas ambientais prevê multa de R$ 300 para cada metro cúbico exportado “sem licença válida (…) outorgada pela autoridade competente”.


Magalhães é um coronel da reserva que faz parte de grupo de policiais militares alçado a postos de comando do Ibama por Ricardo Salles. Antes de assumir o ministério do Meio Ambiente, Salles foi secretário de Geraldo Alckmin, do PSDB, no governo paulista. Sem qualquer experiência prévia na área, Magalhães recebe salário de mais de R$ 10 mil do Ibama, que acumula com o vencimento vitalício de R$ 20 mil mensais que recebe como policial aposentado.

Como coronel aposentado, Magalhães recebe R$ 20 mil mensais, que acumula com os R$ 10 mil que recebe do Ibama para chefiar o escritório do órgão no Pará.
Imagem: Reprodução/Portal da Transparência Estadual de São Paulo

Presidente do Ibama pode estar envolvido

A Tradelink é uma empresa com sede numa região nobre de Londres cuja filial brasileira fica em Ananindeua, na região de Belém, no Pará. Em 3 de fevereiro, um gerente da filial enviou um ofício ao Ibama reclamando que cinco cargas estavam retidas em portos nos Estados Unidos, Bélgica e Dinamarca. Em seguida, pedia autorização de embarque para os contêineres. Àquela altura, porém, eles já haviam deixado o país mais de um mês antes, em 24 de dezembro de 2019.

No dia seguinte, Magalhães emitiu um comunicado. Nele, disse que a Tradelink havia feito os pedidos de exportação, mas que eles não foram analisados em tempo hábil devido à sobrecarga de demandas no Ibama. Por essa razão, o órgão passaria a emitir certidões atestando que a documentação estava em ordem para liberar os produtos no exterior.

A situação esdrúxula não é acidental. Há alguns meses, mostramos que Ricardo Salles agiu para paralisar Ibama e ICMBio. Uma das estratégias usadas para isso foi nomear para postos chave – como a superintendência do Pará – gente sem nenhuma experiência com meio ambiente. Servidores com quem conversamos confirmam que a paralisia continua.



Associação de exportadores de madeira diz que Magalhães agiu com autorização do presidente do Ibama