A CPI vai investigar porque o governo virou refém do lobby dos Bolsonaros pela cloroquina
Andrei Meireles
Por mais que pareçam diferentes, o valor das lendas na política mal difere das crendices no dia a dia da vida de todos. O eventual êxito em cada uma delas, se o vento for a favor, vira marca registrada, carimbo de sucesso. A máxima de que se sabe como uma CPI começa e não como termina, atribuída a Ulysses Guimarães, virou apenas um bordão.
Do começo ao fim, as CPIs costumam ser previsíveis, em sua maioria manipuladas. Falo com carteirinha: como repórter, cobri todas as CPIs relevantes criadas após o AI-5 em 1968. CPI bem sucedida é caso raro. Dá para contar nos dedos. Costumam desandar pelos mais variados motivos. Em algum momento, virou um grande negócio, que cresceu sob a batuta de Eduardo Cunha, o grande maestro do Centrão.

Mesmo com todas essas ressalvas, as poucas CPIs que vingaram fizeram história. A do PC Farias, tesoureiro do Caixa 2, resultou no impeachment de Collor, a dos Correios escancarou o Mensalão, e a dos Bingos, também conhecida como a do fim do mundo, chutou pau da barraca da promiscuidade vigente em Brasília.
As CPIs seguem por caminhos diferentes. Em geral, começam bem e terminam mal. Por alguma ou outra razão, tropeçam mesmo quando recebem a bola na marca do pênalti. A maioria funciona como um Var, pode começar anulando o pênalti. Segue o jogo. Quando enrosca, não vai dar em nada. É como um teatrinho para satisfazer a opinião pública até que mude o interesse para outro escândalo. Joguinho manjado, mas que costuma funcionar.
A CPI da Pandemia é uma exceção nas investigações parlamentares. Ela já começou com um roteiro de começo, meio e fim definidos. Cabe a ela apenas completar o tabuleiro. O ex-ministro Luiz Henrique Mandetta seguiu o script e pôs importantes peças no jogo. Mais do que confirmar com detalhes o que já era sabido, abriu uma brecha para a CPI investigar como as decisões, inclusive sobre saúde, são tomadas no Palácio do Planalto.

Já se sabia que o clã Bolsonaro palpita, com algum poder de decisão, nas mais variadas áreas do governo, especialmente nas que sentem como ameaça. Metem o dedo em tudo. Pelo que Mandetta contou a CPI vão muito além da mão. Estavam presentes em momentos decisivos para a investigação. Carlos Bolsonaro, o Carluxo, se apresentava como um fiscal nas reuniões mais decisivas sobre o enfrentamento inicial à pandemia.
De acordo com o depoimento de Mandetta, Carluxo e seus irmãos participaram da estranha reunião em que surgiu uma minuta de um decreto para modificar a bula da cloroquina para indicá-la para o Covid-19, uma maluquice sem pé nem cabeça ali sepultada pelo presidente da Anvisa, almirante Barra Torres.

Nem caiu de paraquedas. Essa história da cloroquina não surgiu do nada, nem evoluiu por acaso, o que motivou todo esse empenho, até hoje defendido pela bancada governista na CPI, merece ser investigado. O país precisa de uma resposta.
Virou uma das questões centrais da CPI o porque do jogo do tudo ou nada do clã Bolsonaro na cloroquina. Parece que vai além da pura crendice.
A conferir.

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