O ano foi marcado por disputas estratégicas, iniciativas de paz das forças anti-imperialistas e fortalecimento do Sul Global em meio à ofensiva dos EUA, escreve o dirigente comunista José Reinaldo Carvalho 


Por José Reinaldo Carvalho (*) – O ano de 2025 foi um período de intensificação de lutas políticas em meio à exacerbação das contradições do sistema internacional, evidenciando, de um lado, a tentativa de recuperação da hegemonia global pelo imperialismo estadunidense, sob a liderança de Donald Trump, e, de outro, o avanço de iniciativas voltadas à paz, à multipolaridade, ao desenvolvimento compartilhado e à defesa do direito internacional.

O acontecimento mais chocante do ano foi a continuidade do genocídio executado pelo estado sionista israelense contra o povo palestino, com a cumplicidade dos Estados Unidos. Ao longo de 2025, a violência sistemática, a destruição de territórios, a limpeza étnica e o aprofundamento da ocupação seguiram chocando a opinião pública mundial, ao mesmo tempo em que se intensificaram os esforços diplomáticos e populares por um cessar-fogo, pelo fim do genocídio e pelo reconhecimento pleno do Estado nacional da Palestina. Malgrado ter sido adotado um acordo de cessar-fogo a partir de outubro, Israel já o violou cerca de 800 vezes, prolongando o martírio palestino. O governo israelense, useiro e vezeiro em práticas de terrorismo de estado, tem reiterado sua intenção de perpetuar a ocupação da Palestina e a decisão de jamais permitir a existência de um Estado palestino livre e independente.

Entre os marcos simbólicos e políticos do ano estiveram as celebrações do 80º aniversário da vitória sobre o nazifascismo. Na Rússia, as homenagens reafirmaram o papel decisivo da União Soviética, dos comunistas, das forças da Resistência e da unidade dos povos na derrota do fascismo na Europa. Na China, as comemorações lembraram o triunfo sobre o fascismo e a ocupação japonesa, encerrando a Segunda Guerra Mundial também no continente asiático, com forte ênfase na memória histórica e no direito dos povos à autodeterminação.

No campo econômico, 2025 foi profundamente impactado pela escalada da guerra comercial promovida pelo governo Trump. A imposição generalizada de tarifas e medidas protecionistas expôs o unilateralismo dos Estados Unidos e sua tentativa de conter, por meios coercitivos, o avanço da multipolaridade e o próprio declínio relativo da economia estadunidense no cenário global.

A ofensiva imperialista ganhou contornos ainda mais explícitos com o lançamento da nova estratégia de segurança nacional dos EUA. O documento atualizou a famigerada Doutrina Monroe e recolocou a América Latina como alvo prioritário de uma política neocolonial, intervencionista e desestabilizadora. Esse movimento se traduz nas atuais ameaças de guerra contra a Venezuela, retórica intervencionista dirigida à Colômbia e ao México, interferências e chantagens em processos eleitorais, como na Argentina e em Honduras, além da continuidade do bloqueio econômico contra Cuba, reforçado pela manutenção da ilha socialista na lista de países patrocinadores do terrorismo.

Em contraposição a esse cenário, 2025 também foi marcado por importantes iniciativas multilaterais lideradas pelo Sul Global. A realização da 17ª Cúpula do BRICS, no Brasil, e da Cúpula do G20, na África do Sul, evidenciou a articulação de países que reivindicam uma nova ordem econômica e política internacional, com maior equilíbrio, justiça e representatividade. Esses encontros reforçaram a crítica ao sistema financeiro internacional vigente e defenderam reformas nas instituições globais.



O protagonismo da China destacou-se de forma ainda mais nítida na política e na economia globais. Em 2025, o país consolidou seu impetuoso desenvolvimento e lançou a Iniciativa pela Governança Global, somando-se a outras propostas apresentadas anteriormente pelo presidente Xi Jinping, como as iniciativas de Desenvolvimento Global, de Segurança Global e de Civilização Global, além do Cinturão e Rota. Estas iniciativas reforçam a defesa do multilateralismo, da cooperação entre Estados soberanos e de soluções compartilhadas para enfrentar os desafios globais.

O ano também foi marcado pelo aprofundamento de acordos de cooperação Sul-Sul, pelo fortalecimento de moedas nacionais em transações internacionais, por avanços em projetos de integração energética e logística fora do eixo atlântico tradicional e pelo crescimento de mobilizações internacionais em defesa dos direitos dos trabalhadores, da paz e contra o militarismo.

Com negociações reabertas e “garantias de segurança” em disputa, o ano termina com pressão por cessar-fogo no conflito na Ucrânia mas sem acordo sólido sobre território, neutralidade da Otan e papel da Otan.

Em 2025, a guerra na Ucrânia entra em um estágio de irrefreáveis avanços militares da Rússia, combinados a tentativas intermitentes de negociação, com sinais de fadiga social e falência política do regime de Kiev e a busca, ainda incerta, por um cessar-fogo consistente.
Moscou mantém suas exigências centrais: reconhecimento do controle russo sobre áreas do Donbass e abandono, por Kiev, de ambições de adesão à Otan e ressurgimento de seu poderio militar.

Do ponto de vista das forças que defendem paz, cooperação e multipolaridade, o nó do conflito permanece ligado à arquitetura de segurança europeia pós-Guerra Fria e à expansão da Otan. A Rússia segue apresentando como justificativas estruturais a necessidade de neutralidade ucraniana, a contenção de ameaças militares vindas do território ucraniano associado à Otan, além dos objetivos declarados de desmilitarização e desnazificação.

É nesse contexto que por meio da chamada “coalizão dos dispostos”, potências imperialistas europeias tentam estruturar garantias de segurança à Ucrânia e até uma eventual presença de força multinacional em cenário pós-cessar-fogo. Em dezembro, Emmanuel Macron afirmou ter discutido o tema com o secretário-geral da Otan, Mark Rutte, destacando que o grupo pretende avançar em janeiro com compromissos de segurança voltados à Ucrânia.

Há um problema de origem nas posições da União Europeia e da Otan que as identificam com propósitos alheios aos anseios de paz dos povos europeus: ao priorizarem “garantias” que, na prática, podem ser lidas por Moscou como continuidade da lógica de blocos e projeção militar na fronteira russa, essas iniciativas tendem a elevar a desconfiança e dificultar concessões recíprocas, o que impede um cessar-fogo duradouro. A consequência é um paradoxo: mecanismos apresentados como “segurança” podem ser percebidos pela outra parte como ameaça, mantendo o mundo em situação de permanente insegurança. Além disso, são posições que favorecem a confrontação com a Rússia, aumentando as ameaças de uma guerra que teria consequências ainda mais devastadoras. O resultado, ao final de 2025, é um cenário em que as negociações pelo cessar-fogo e a paz não conseguiram dar uma solução satisfatória aos problemas de fundo que originaram a Operação Militar Especial russa em fevereiro de 2022.

O balanço de 2025 revela, assim, um mundo atravessado por conflitos, mas também por resistências e alternativas concretas à ordem imperialista. As perspectivas que se desenham apontam para o fortalecimento da multipolaridade, o avanço das lutas por soberania nacional, justiça social e desenvolvimento compartilhado, bem como para a ampliação das forças que defendem um mundo sem imperialismo, baseado na paz e no progresso social.

(*) Jornalista, editor internacional, membro do Comitê Central do Partido Comuista do Brasil e presidente do Cebrapaz (Centro Brasileiro de Solidariedade aos Povos e Luta pela Paz)

Publicado originalmente por: Resistência


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