Ao evocar a passagem bíblica em que Deus entrega o próprio filho, ex-presidente tentou sacralizar a sucessão

Flávio Bolsonaro (Foto: Reprodução)
Flávio Bolsonaro (Foto: Reprodução)

247 – Ao lançar o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) como potencial candidato à Presidência, Jair Bolsonaro (PL) tentou dar ao gesto um tom de “missão” e de sacrifício pessoal — e, para isso, recorreu a uma imagem que remete diretamente à narrativa cristã sobre Deus e Jesus. Na carta escrita de próprio punho e divulgada no Natal, 25, Bolsonaro afirma estar entregando “o que há de mais importante” para uma tarefa de “resgatar o Brasil”, numa formulação que, implicitamente, aproxima sua decisão da passagem bíblica em que Deus entrega seu próprio filho como prova máxima de amor pela humanidade. A informação foi publicada pela jornalista Vera Rosa, na Coluna do Estadão.

O trecho central da carta explicita essa analogia, ao transformar o ato político — lançar o próprio filho como herdeiro — em um gesto de sacralização e autoridade moral. Bolsonaro escreveu: “Entrego o que há de mais importante na vida de um pai: o próprio filho, para a missão de resgatar o Brasil”. Ao adotar esse registro simbólico, o ex-presidente não apenas tenta blindar a escolha contra críticas e disputas internas, como também se coloca como figura capaz de “abençoar” a sucessão, reforçando sua imagem de líder incontestável do campo bolsonarista mesmo em meio à crise.

A carta foi lida por Flávio pouco antes de Bolsonaro passar por cirurgia para corrigir uma hérnia inguinal bilateral. O texto, segundo a reportagem, foi planejado para manter o controle sobre um grupo político rachado, segurar dissidências no Centrão e conter a desagregação crescente dentro do bolsonarismo.

Bolsonaro ainda apresentou a decisão como uma medida consciente e legítima, afirmando: “Trata-se de uma decisão consciente, legítima e amparada no deseja de preservar a representação daqueles que confiaram em mim”. De acordo com a publicação, trata-se do primeiro documento político do ex-presidente desde sua prisão, há um mês, em um momento em que sua influência é contestada dentro do próprio grupo e seus aliados buscam alternativas para 2026.



Carta tenta conter dissidências e manter controle sobre o bloco político

De acordo com o jornal Estado de S. Paulo, o documento não foi um gesto espontâneo, mas parte de uma estratégia para reafirmar comando sobre um campo político em ebulição. Ao “abençoar” Flávio e apresentar a escolha como uma entrega pessoal, Bolsonaro buscaria conter dissidências e manter a disciplina de uma base que, nos bastidores, já discute outras opções.

O texto surge num contexto em que o bolsonarismo dá sinais de fragmentação: há disputa por protagonismo, divergências sobre candidaturas estaduais e resistência do Centrão em aderir, sem reservas, a um nome que ainda não se consolidou como consenso.

Racha com Michelle expõe disputa pela sucessão

O desgaste interno ficou evidente com o conflito entre a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro e os filhos do ex-presidente. A divergência não envolve apenas o candidato ao Planalto, mas também a definição de quem carregará a bandeira bolsonarista nas disputas estaduais de 2026.

Em vídeo publicado no dia 24, véspera de Natal, Michelle pediu orações por Bolsonaro, pregou paz, mas também deixou uma crítica velada a pessoas próximas do círculo bolsonarista. Ela afirmou: “Não se deixem abater pelas maldades. Perseverem, apesar das traiições, ainda que venham das pessoas mais próximas”. E completou: “As trevas jamais impedirão a nossa luz de brilhar”.

A mensagem, embora formulada em tom religioso, foi lida politicamente como uma estocada em aliados e familiares, reforçando que a disputa pelo controle do bolsonarismo está longe de ser resolvida.

Centrão resiste a Flávio e mantém preferência por Tarcísio

Mesmo com bom desempenho na pesquisa Genial/Quaest divulgada neste mês, Flávio ainda é visto com desconfiança por setores do Centrão. Segundo a reportagem, líderes do grupo identificam fragilidades na candidatura e, nos bastidores, definem o senador como um possível “cavalo paraguaio” — expressão que sugere alguém que começa forte, mas perde tração e chega enfraquecido ao final da corrida.

Por isso, o nome preferido do grupo para enfrentar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) continua sendo o do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Depois dele, o outro nome frequentemente citado é o do governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD).

Impasse permanece e beneficia o Planalto

A carta de Bolsonaro tenta impor um herdeiro, mas não resolve o impasse. Na prática, apesar do apelo por unidade, o bolsonarismo segue dividido, e o Centrão ainda não sinalizou alinhamento com Flávio como candidato único. O resultado é um campo adversário desorganizado, envolto em disputas internas e sem acordo sobre quem enfrentará Lula.

Segundo o jornal Estado de S. Paulo, esse quadro é observado com satisfação pelo PT e pelo Planalto, que se beneficiam da falta de coesão na oposição e da dificuldade do bolsonarismo em converter mobilização em um projeto unitário para 2026.

Publicado originalmente por: Brasil 247

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