As contas da campanha eleitoral do presidente francês, Emmanuel Macron, estão sob os holofotes nesta quinta-feira (7). Uma investigação realizada pela rádio France Info mostra que o chefe de Estado teria se beneficiado de diversas vantagens que teriam escapado da vigilância das autoridades eleitorais.


O presidente Emmanuel Macron e a esposa Brigitte durante evento em Clairefontaine (5 de junho de 2018)REUTERS/Gonzalo Fuentes

O jornal Le Monde e o site Médiapart já haviam revelado alguns dos descontos que o então candidato do movimento Em Marcha, Emmanuel Macron, teria recebido durante sua campanha, em 2016, e que preocuparam também a Comissão Nacional de Contas de Campanha. Depois de investigar as supostas irregularidades, o órgão decidiu que tudo estava dentro da lei. Mas de acordo com a rádio France Info, o presidente teria obtido mais de 70% de desconto nos locais onde realizou seus comícios.


Poucos candidatos têm o hábito de usar salas de teatro para comícios. Macron esteve em duas: no dia 6 de fevereiro de 2017 na sala Bobino e no dia 8 de março do mesmo ano, no Teatro Antoine. Esses dois lugares pertencem a uma mesma pessoa, Jean-Marc Dumontet. Em poucos anos, ele se tornou uma referência no setor e montou sua produtora, a JMD Prod.

Durante a campanha presidencial, Dumontet se aproximou do casal Macron e declarou publicamente seu apoio à candidatura do antigo ministro da economia. No dia 8 de março de 2017, ao final de um evento sobre a igualdade entre homens e mulheres, Brigitte Macron agradeceu o produtor por “oferecer” a sala para a campanha.

Desconto astronômico


Para o evento, o Teatro Antoine cobrou € 3.000 ao candidato Emmanuel Macron, um preço muito inferior aos praticados normalmente pela empresa de Jean-Marc Dumontet. Um mês antes, na sala Bobino, o mesmo valor foi cobrado. A radio France Info tentou orçar as mesmas salas para eventos similares. Por telefone, o gerente da sala Bobino anunciou: “o preço de base é de € 11 mil sem impostos (€ 13 mil com taxas), mas caso queiram utilizar os vídeo-projetores ou coisas do tipo, será cobrada uma taxa extra”. Com isso, Macron foi presenteado com pelo menos 75% de desconto.



O preço não é a única coisa que chama a atenção nas contas. A falta de informação e detalhes também incomoda. Normalmente, na contratação de salas de mais de 700 lugares, são mencionados nas faturas, detalhes como iluminação e segurança contra incêndio, por exemplo. A comissão de contas de campanha parece não ter estranhado e validou as duas faturas.

Jean-Marc Dumontet afirma que não há nada de errado e que o partido de Macron soube negociar os preços: “Eles haviam bloqueado várias datas. Cheguei a ficar irritado. No fim, eles vieram conversar de última hora, no momento em que sabiam que conseguiriam um preço melhor”.

No entanto, em e-mails vazados pelo “Macron Leaks” (quando mais de 100 mil e-mails da equipe de Macron foram divulgados), Jean-Marc Dumontet parecia afável com o candidato. No dia 31 de dezembro de 2016, o atual deputado Stanislas Guerini, então líder do partido em Paris, escreveu: “O proprietário da sala Bobino está disposto a nos ceder a sala por um baixo custo”. Quatro dias depois, em outro e-mail, Guerini descreve a amabilidade do produtor: “Conversei com Dumontet e ele está disposto a remanejar outros clientes para que possamos ter a data que escolhemos. ”

O produtor afirma não ter “presenteado” seu candidato favorito. Mas quando questionado sobre o valor cobrado à última empresa a ter reservado a sala para comparar com o valor pago por Macron, Jean-Marc saiu pela tangente: “Não faço ideia, pois não reservamos muitas salas para empresas”. Após a eleição de Macron, Jean-Marc Dumontet tinha a ambição de se tornar ministro da Cultura, o que não aconteceu.

A Comissão Nacional de Contas de Campanha admitiu que as faturas dos teatros não estavam bem detalhadas. No entanto, informaram que o protocolo, neste caso, era verificar se os eventos haviam de fato ocorrido, para validar o reembolso.

Quase de graça


No norte de Paris, a sala La Bellevilloise, que se tornou um dos lugares favoritos para comícios políticos, também parece ter favorecido Macron. Enquanto o candidato socialista Benoit Hamon precisou desembolsar € 2.580 pelo espaço, Macron só gastou € 200. A empresa Oriza, dona do lugar, disse em resposta à Comissão de Contas que essa é uma pratica normal.



Segundo a investigação da radio France Info, o artigo L52-8 do código eleitoral deixa claro que “pessoas físicas não poderem participar ao financiamento de uma campanha eleitoral de um candidato, conceder doações, fornecer bens, serviços ou outras vantagens, diretas ou indiretas, a preços inferiores aos praticados pelo mercado”.

A Comissão Nacional de Contas de Campanha, que não identificou nenhuma irregularidade nesses descontos, diz que a investigação sobre o caso foi encerrada e o prazo para que ela fosse reaberta se esgotou.

No entanto, segundo o professor de direito público e membro do Observatório de Ética Pública, Romain Rambaud, as empresas envolvidas no caso podem ser alvo de um inquérito. Já o presidente não será questionado, por ter imunidade presidencial.

RFI

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