Na negociação do pacote de promessas e contrapartidas entabulada por Guedes como fiador de Moro e Bolsonaro, quem está ganhando de goleada mesmo é o negociador Guedes, que até agora ganhou todas.
Esse Xadrez foi feito com a colaboração de leitores bem informados.
Peça 1 – o acordo Guedes-Moro
A revelação de Bebiano de que Guedes e Moro se encontraram varias vezes antes da eleição joga luz sobre como o COAF foi parar nas mãos de Moro e quais eram os interesses, lado a lado, envolvendo a questão.Por que Guedes foi escalado por Bolsonaro? Porque Guedes já tinha sido anunciado como futuro ministro da Economia, ministério que abrigava o COAF. A transferência do COAF para o Ministério da Justiça dependeria do aval do titular da pasta. Ao negociar com Guedes, como emissário de Bolsonaro, Moro tinha certeza de que não precisaria negociar com mais ninguém, que a fatura estaria liquidada com a vitória de Bolsonaro.
Peça 2 – porque o COAF foi o tema do encontro
Ao ser oferecido o cargo de Ministro da Justiça a Moro, ele passou a alimentar o sonho de levar a experiência da Lava Jato, que era uma experiência de Força Tarefa – que logo adiante acabaria – a uma estrutura permanente de governo. O Ministério da Justiça se transformaria numa lava jato permanente, com uma imensa estrutura a serviço dos interesses de Moro.Se ele alcançasse seus objetivos, se tornaria o homem mais poderoso da república, podendo escolher entre ser ministro do Supremo Tribunal Federal ou mesmo ser candidato à presidência da república.
No período em que houve a negociação, antes da eleição, Moro tinha forte apoio no judiciário, inclusive no STF; tinha forte ascendência sobre o Ministério Público Federal e Polícia Federal, tinha apoio dos Auditores Fiscais da Receita Federal e de servidores e chefes do COAF (vide entrevista do presidente do COAF Antônio Ferreira em dezembro de 2018 confirmando que os servidores do COAF trabalhavam em salas de situação junto com a lava jato).
Mas Moro precisava mais: o controle absoluto do COAF. Com o COAF sob o guarda chuva do ministério da Justiça, Moro controlaria a Polícia Federal, o COAF, parte do judiciário, ministério público e Receita Federal (uma entidade associativa dos Auditores Fiscais da Receita Federal apoiava expressamente a transferência do COAF para o ministério comandado por Moro). Foi essa garantia dada por Guedes, autorizado por Bolsonaro, que convenceu Moro a largar a toga em troca do apoio explícito à campanha de Bolsonaro para depois assumir o ministério da justiça.
Peça 3 – a barganha com os Bolsonaro
Em contrapartida, interessava ao clã Bolsonaro que os integrantes da família fossem blindadas no COAF. Desde janeiro de 2018 o Ministério Público tinha conhecimento do relatório do COAF apontando as movimentações suspeitas de Queiroz, tesoureiro do clã.O Ministério Público do estado do RJ tinha sentado em cima do caso, não tomando nenhuma providência para apuração dos fatos. O Ministério Público Federal fez de conta que não era com ele. Na operação Furna da Onça a Lava Jato prendeu vários deputados por suspeitas semelhantes às que pesavam sobre Flávio Bolsonaro. A diferença é que este nem sequer foi citado na operação. Mas o clã Bolsonaro sabia que o relatório existia e que a qualquer momento o assunto se tornaria público. Então era preciso que o COAF blindasse o clã, garantindo que novos relatórios não incriminassem a família. Era o tipo de negócio que ficava bom para todo mundo: todo o poder que Moro queria em troca da blindagem do clã Bolsonaro.
Peça 4 – a comprovação da teoria do fato
Os fatos subsequentes a eleição presidencial confirmam a teoria do fato aqui apresentada:Três dias após a eleição, Bolsonaro anuncia Moro como ministro da Justiça e a transferência do COAF aos cuidados de Moro, restando evidente que a negociação da transferência do COAF tinha ocorrido bem antes da eleição, dada a completa impossibilidade de tal decisão administrativa, envolvendo dois ministérios e mudanças legislativas, pudesse ter sido tomada no calor das comemorações da vitória eleitoral.
Moro passou imediatamente a montar suas equipe, escolhendo delegados da Polícia Federal e Auditores Fiscais da Receita Federal de extrema fidelidade com a lava jato. Para a presidência do COAF nomeou Roberto Leonel, que era um dos Auditores Fiscais que passava informações sigilosas para a lava jato de forma informal, conforme revelado pelo The Intercept Brasil, além da delegada Erica Merena, outra fiel defensora dos métodos da Lava Jato de primeiro acusar e prender para depois ver se acha alguma prova.
Peça 5 – o destino conspira contra Moro
Tudo ia bem para os Bolsonaro também. Veio a Operação Furna da Onça em 08 de novembro e nem Flávio nem Queiroz estavam entre os alvos. Queiroz seria intimado somente três semanas após a eleição, mesmo o Ministério Público tendo conhecimento das movimentações desde janeiro de 2018.Uma semana após a intimação de Queiroz, Flávio Bolsonaro se reuniria com o promotor encarregado do caso. Tudo em segredo. Tudo ia bem. Aconteceu então um imprevisto em 06 de dezembro, o vazamento ao público do relatório COAF do Queiroz. Após o vazamento, o Ministério Público do Estado do RJ pediu mais informações ao COAF, e então, inexplicavelmente, ficou-se sabendo que Queiroz tinha movimentado, não 1,2 milhão mas 7 milhões.
Moro como ministro da justiça nomeou as pessoas de sua confiança para o COAF. Mas já não poderia dar a contrapartida que Bolsonaro esperava dele: a blindagem do clã para que nenhuma nova informação viesse a público. Bolsonaro perdeu interesse em manter o COAF com Moro, pois percebeu o poder desmesurado que tinha dado a Moro. Ato contínuo, o congresso rejeitou a transferência do COAF para o MJ.
Peça 6 – Moro preso a Bolsonaro
Apesar das derrotas sucessivas de Moro, e da constatação do fracasso do seu plano de transformar o Ministério da justiça numa super lava jato incorporada à estrutura repressora e controladora do governo, Moro não tem opção a não ser continuar apoiando Bolsonaro.Na negociação do pacote de promessas e contrapartidas entabulada por Guedes como fiador de Moro e Bolsonaro, quem está ganhando de goleada mesmo é o negociador Guedes, que até agora ganhou todas. Dos outros dois, nem Bolsonaro nem Moro entregaram um ao outro tudo que tinham prometido. De qualquer forma, Moro é o único que está perdendo de goleada. Estava 7 x 1 contra ele. Agora o Bebiano lhe jogou mais uma pá de cal para sujar seu belo terno preto italiano.
GGN
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