Se fosse a Davos, provavelmente Jair Bolsonaro seria recebido diferentemente de 2019, talvez como burlesco e despreparado. Não teria como esconder os escombros do golpe e o isolamento internacional em que se encontra o Brasil
Jair Bolsonaro (Foto: REUTERS/Arnd Wiegmann)
O filme Democracia em Vertigem, da cineasta Petra Costa, retirou definitivamente o véu com o qual tentaram esconder o golpe de Estado que derrubou a Presidenta Dilma, a parceria da imprensa oligarquia e a eleição de Jair Bolsonaro.
A repercussão do filme no mundo (um dos mais vistos no Netflix), agora indicado para o Oscar, é devastadora. Causou um forte impacto no governo e reações agressivas dos cúmplices da tragédia política, econômica e social do Brasil.
Jair Bolsonaro cancelou a participação no Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, a ser realizado do dia 21 a 24 deste mês, com 3.000 participantes.
Mas não foi apenas a repercussão do filme de Petra que levou o presidente da República a desistir da ida a Davos. Quando ele foi ao Fórum Mundial, em janeiro de 2019, ele mentiu para a platéia dos chefes de Estado e dos maiores investidores do mundo.
Pela primeira vez, o Brasil, em 2019, abriu os trabalhos do Fórum e coube a Jair Bolsonaro, recém eleito, fazer o discurso de abertura. Para isso, foi destinado o tempo de 45 minutos, mas ele falou apenas 6 minutos.
O discurso foi considerado decepcionante por grande parte dos participantes e da imprensa mundial.
Jair Bolsonaro assumiu compromisso com os tratados internacionais de combate à degradação do meio ambiente.
Disse que compatibilizaria crescimento econômico com meio ambiente.
Mas faz o contrário. Desmonta as instituições que cuidam do meio ambiente, muda a legislação mais moderna do mundo e fustiga organismos internacionais, chefes de Estado, com acusações levianas.
Disse que colocaria o Brasil, em pouco tempo, entre os 50 países mais desenvolvidos do mundo. Mas acumula desastres em todo seu governo.
Jair Bolsonaro não tem nenhum dado positivo para apresentar em Davos.
A absoluta falta de projeto para o país, a degradação econômica, social e ambiental, a fragilidade institucional e a insegurança jurídica, são os frutos do golpe de Estado, que, evidentemente, causam receio aos possíveis investidores.
A imprensa internacional estaria a postos para perguntar obviamente sobre o filme, a Amazônia e o governo dele.
Está cada vez mais claro que a obsessão do governo é apenas desmontar o projeto de desenvolvimento sustentável e inclusão social dos governos Lula e Dilma, que proporcionaram estabilidade política, econômica e melhoria das condições de vida da população.
Se fosse a Davos, provavelmente Jair Bolsonaro seria recebido diferentemente de 2019, talvez como burlesco e despreparado. Não teria como esconder os escombros do golpe e o isolamento internacional em que se encontra o Brasil.
Os últimos dados da economia, divulgados recentemente, revelam o agravamento da crise, o país à deriva.
O Brasil fechou o ano com o registro da maior fuga de capitais das última quatro décadas, a retirada de US$ 62,244 bilhões pelos investidores, para aplicar em outros países.
Somente da bolsa foram retirados US$ 44,5 bilhões. Com os cortes de investimentos do Estado e do setor privado não há como o país crescer.
Das reservas acumuladas pelos governos Lula e Dilma, um total de RS$ 375 bilhões, o governo Bolsonaro queimou RS$ 34 bilhões tentando segurar a alta do dólar.
Não bastasse as queimadas na Amazônia, os ataques impunes a comunidades indígenas e a trabalhadores rurais, fatores que causam mais desgaste na imagem do Brasil no exterior, a economia apresentou um pibinho , em 2019, de apenas 1,12%.
O Brasil tem hoje 12 milhões de desempregados e 38 milhões de pessoas vivendo de bicos, sem perspectiva de serem inseridas no mercado de trabalho formal.
A indústria, em novembro, das 15 regiões pesquisadas pelo IBGE, 11 tiveram uma queda acentuada, de 1,2%. Nos últimos quatro anos depois do golpe, o Brasil perdeu 17 indústrias por dia.
Segundo a Agência Reuters, em outubro, na categoria varejo ampliado, que inclui automóveis, a queda no comércio foi de 0,5%. O mercado havia projetado 1,1%.
Isso acontece no momento de liberação do saque do FGTS, que seria, segundo o governo, para ativar a economia, mas o dinheiro foi parar nas financeiras e nos bancos, para pagar dívidas. Mais de 65% da população está endividada.
Cerca de 70% do PIB é composto pelo setor de serviços. Na passagem de outubro para novembro, três das cinco atividades do setor, tiveram queda.
Com destaque para o recuo de transportes, serviços auxiliares aos transportes e correio (-0,7%), serviços de informação e comunicação (-0,4%) e serviços prestados às famílias (-1,5%). A queda foi mais acentuada em 16 dos 27 estados.
A inflação voltou. O índice acumulado em 12 meses bateu 4,31%, acima do centro da meta, de 4,25. Com aumento vertiginoso do preço da carne (37%), feijão e combustíveis.
A Balança Comercial ficou com saldo positivo em US$ 46,7 bilhões, 19,6% abaixo do registrado em 2018. E deve agravar ainda mais com o acordo assinado entre Estados Unidos e China.
Os Estados Unidos são concorrentes do Brasil no comércio internacional de produtos agropecuários, mineração, petróleo e outros produtos.
A subserviência do governo Bolsonaro ao governo de Donald Trump tem afetado diretamente a economia brasileira e desgaste nas relações internacionais. A desastrosa ingerência no conflito Iran-Estados Unidos, mais o acordo comercial entre Estados Unidos e China custarão caro ao Brasil. Em breve as consequências virão.
Com o Brasil em situação tão dramática, não há o que apresentar em Davos. Essas e outras vão sedimentando o isolamento do Brasil no cenário internacional e amarrando nosso futuro no passado colonial, na bola de ferro do atraso.
Laurez Cerqueira
Autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes - vida e obra; Florestan Fernandes – um mestre radical; e O Outro Lado do Real


Postar um comentário
-Os comentários reproduzidos não refletem necessariamente a linha editorial do blog
-São impublicáveis acusações de carácter criminal, insultos, linguagem grosseira ou difamatória, violações da vida privada, incitações ao ódio ou à violência, ou que preconizem violações dos direitos humanos;
-São intoleráveis comentários racistas, xenófobos, sexistas, obscenos, homofóbicos, assim como comentários de tom extremista, violento ou de qualquer forma ofensivo em questões de etnia, nacionalidade, identidade, religião, filiação política ou partidária, clube, idade, género, preferências sexuais, incapacidade ou doença;
-É inaceitável conteúdo comercial, publicitário (Compre Bicicletas ZZZ), partidário ou propagandístico (Vota Partido XXX!);
-Os comentários não podem incluir moradas, endereços de e-mail ou números de telefone;
-Não são permitidos comentários repetidos, quer estes sejam escritos no mesmo artigo ou em artigos diferentes;
-Os comentários devem visar o tema do artigo em que são submetidos. Os comentários “fora de tópico” não serão publicados;