Pesquisa do Unicef avalia impactos sobre crianças e adolescentes quanto a segurança alimentar, educação, saúde mental e medidas de prevenção contra o coronavírus
“Desde o começo da pandemia, alguma criança ou adolescente que mora com você deixou de comer porque não havia dinheiro para comprar mais comida?” A resposta para essa pergunta foi "sim" entre 13% dos entrevistados na terceira rodada da pesquisa Impactos Primários e Secundários da Covid-19 em Crianças e Adolescentes.
Lançado
nesta quarta-feira (30), o estudo faz parte de uma iniciativa do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) que busca analisar as consequências da pandemia para os jovens brasileiros nos âmbitos de renda, educação, saúde mental e alimentação.
O Unicef divulgou novos dados referentes a maio de 2021 que podem ser comparados com aqueles publicados em agosto e dezembro de 2020. A empresa Inteligência em Pesquisa e Consultoria (Ipec) foi a responsável pelo levantamento, que ouviu 1.516 brasileiros com 18 anos ou mais entre os dias 10 e 25 de maio deste ano.
Desde quando as primeiras medidas de isolamento social entraram em vigor no Brasil, a maioria dos participantes da pesquisa relatou ter alterado seus hábitos alimentares. Isso inclui aumento no consumo de fast food, refrigerantes e produtos industrializados, além da diminuição no consumo de alimentos mais saudáveis. Em relação a frutas e verduras, por exemplo, 41% disseram ter passado a comê-las menos, número que aumentou em relação a julho de 2020 (34%).
As consequências da pandemia para a renda familiar impactaram diretamente também a alimentação de crianças e adolescentes. Se em 13% dos domicílios os pequenos deixaram de comer pela falta de dinheiro, um recorte social revela que nas classes D e E a porcentagem é ainda mais preocupante: essa é a realidade em uma a cada três casas.
“A insegurança alimentar tem sido um problema desde o início da pandemia. É um alerta importante para os impactos profundos que pode ter na saúde de todos, em especial crianças e adolescentes”, diz Florence Bauer, representante do Unicef no Brasil, em comunicado.
Em meio a esse cenário, a alimentação oferecida pelas escolas públicas continuou sendo essencial para os jovens matriculados, mas quase metade deles deixou de receber a comida. “O fechamento prolongado das escolas contribuiu ao agravamento dessa situação, muitas crianças e adolescentes dependem da merenda escolar”, afirma Bauer.
A opinião do brasileiro parece estar mudando em relação à continuidade desse fechamento. Enquanto em julho de 2020 82% dos entrevistados consideravam a medida como muito importante para a prevenção contra o coronavírus, o número caiu para 71% em dezembro do ano passado e agora está em 59%. A taxa dos que encaram a ação como “pouco” ou “nada importante”, por outro lado, cresceu: agora são, respectivamente, 24% e 15%.
Mas, mesmo entre as escolas que têm oferecido aulas presenciais, menos da metade dos alunos voltou a realizar as atividades. Quanto às instituições que ainda não retornaram, é alto o índice de pessoas que não se sentem à vontade para enviar seus filhos para a escola. A cada quatro famílias, três consideram que as crianças e os adolescentes voltarão às atividades presenciais somente quando sentirem que não há risco de contaminação.
“Por isso, é essencial que o processo de reabertura seja realizado em diálogo tanto com as famílias como com profissionais da educação, estudantes e toda a comunidade escolar”, sugere Bauer.
A representante do Unicef no Brasil defende que é importante envolver todos na implementação dos protocolos de proteção contra a Covid-19 em um cenário em que é urgente reabrir as escolas “para prevenir danos irreversíveis a uma geração inteira de crianças e adolescentes pobres”, argumenta.
Isso porque o ensino remoto ainda encontra muitas dificuldades para prosperar no país, onde a dificuldade no acesso à internet prejudica as crianças e os adolescentes na mesma proporção da falta de equipamentos adequados. A pesquisa do Unicef revela que 42% deles acompanham as aulas por meio apenas de um celular, sendo que 17% são aparelhos de outra pessoa.
A necessidade de se dedicarem a tarefas que os impedem de estudar, como trabalhar, cuidar de familiares ou da casa, também foi apontada como uma dificuldade enfrentada pelos adolescentes. Já entre as crianças, a falta de tempo que adultos têm para orientá-las no estudo foi outro aspecto frequente mostrado pela pesquisa.
Os impactos se traduzem também na saúde mental das crianças e dos adolescentes, outro tema abordado pelo Unicef. Alterações no sono, mudanças repentinas de humor e menor interesse em atividades rotineiras foram três dos principais sintomas associados a transtornos relatados. Mais da metade dos adultos participantes observou pelo menos uma manifestação do tipo em crianças ou adolescentes com quem moram.
*Com supervisão de Luiza Monteiro
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