Desde a chegada da administração Trump à Casa Branca, Kiev observa quais serão as decisões americanas em relação à Ucrânia. Após a suspensão na semana passada, e por pelo menos três meses, dos programas de ajuda humanitária dos Estados Unidos, o presidente Donald Trump declarou querer negociar um acordo com a Ucrânia que ofereceria uma garantia sobre suas terras raras. Terras que abrigam materiais raros usados principalmente na indústria eletrônica.
Por: Emmanuelle Chaze, correspondente da RFI em Kiev, e AFP
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Mineiros andam em um transportador no túnel da mina de carvão na região de Dnipropetrovsk, Ucrânia, na sexta-feira, 7 de abril de 2023. AP - Evgeniy Maloletka |
Donald Trump quer garantir que os Estados Unidos possam explorar os materiais raros encontrados nos solos ucranianos. Isso inclui ferro, manganês, urânio, titânio, lítio, minérios de zircônio, além de carvão, gás e petróleo.
Trata-se, portanto, de muitos materiais, cerca de uma centena, segundo estimativas geológicas ucranianas, que são cobiçados por grandes grupos industriais, especialmente para fabricar componentes elétricos, como os usados em smartphones.
Segundo o ministério da Economia ucraniano, o país possui uma das maiores reservas europeias desses materiais raros: falam-se em trilhões de dólares em materiais exploráveis, dos quais mais de 70% estariam nas regiões de Dnipropetrovsk, Donetsk e Luhansk, áreas que ficam na linha de frente dos combates. E esses recursos também interessam ao agressor russo.
Matérias-primas que representam metade do PIB ucraniano
Esses solos já são explorados, representando uma grande parte do produto interno bruto (PIB) da Ucrânia — cerca de metade —, além de constituir dois terços das exportações ucranianas. Por isso, quando os combates se aproximam da linha de frente, o que fecha por último, mesmo depois que a maior parte dos civis já tenha partido, são as minas e os locais de exploração. Porque há um enorme interesse econômico para a Ucrânia em continuar operando essas minas.No Donbass, por exemplo, da estrada, é possível se ver, ao longe, tiros de artilharia e, em primeiro plano, ônibus levando mineiros para seus locais de trabalho.
Para os americanos, esses recursos também representam um interesse estratégico, já que 80% dos materiais raros usados na indústria americana vêm da China. A exploração dos solos ucranianos permitiria a Washington uma menor dependência do mercado chinês. Consequentemente, esses materiais também interessam aos europeus pelas mesmas razões.
Kiev favorável à exploração de seus solos
De acordo com a mídia ucraniana, Kiev seria favorável à exploração de seus solos. Isso até faria parte do plano para a vitória ucraniana — que havia sido elaborado muito antes da vitória de Trump nas eleições americanas — de permitir que países aliados explorassem os recursos ucranianos, com uma condição: que houvesse garantias reais de que essas terras não estivessem nas mãos dos russos.Esse é um assunto de defesa para a Ucrânia, mas também, mais geralmente, para a Europa e a Otan, pois uma parceria foi iniciada desde 2014, e depois desenvolvida em 2021, entre a Ucrânia e seus aliados ocidentais para garantir o fornecimento de matérias-primas, como o titânio, amplamente utilizado na área de defesa.
O que são terras raras
Os elementos de terras raras são compostos por 17 matérias-primas, como disprósio, neodímio e cério, descobertos no final do século XVIII na Suécia.Embora suas propriedades sejam diferentes, esses elementos foram agrupados sob um mesmo nome porque geralmente estão presentes no mesmo solo.
Uma vez retirado da terra, o material deve passar por um tratamento de "separação" dos diferentes minerais em operações químicas que às vezes envolvem ácidos.
São raras mesmo?
Na verdade, as terras "raras" são bastante abundantes no planeta. Em 2024, o Centro Geológico dos Estados Unidos estimou que haveria mais de 110 milhões de toneladas no mundo.Mais de um terço dessas reservas estão na China, com 44 milhões de toneladas. Em seguida, vem Vietnã (22), Brasil (21), Rússia (10) e Índia (7).
"Quanto mais aumenta a demanda por essas matérias-primas, mais as pessoas as procuram e as encontram. O problema está mais na relação entre o custo de extração e o preço de mercado", analisa John Seaman, pesquisador do Instituto Francês de Relações Internacionais (IFRI).
A demanda continuará aumentando. Para atingir a neutralidade de carbono até 2050, a União Europeia, por exemplo, precisará de 26 vezes mais terras raras do que usa atualmente, calculou a Universidade KU Leuven para a associação europeia de produtores de metais Eurometaux.
O que têm de especial?
Cada um desses minerais tem seus próprios usos na indústria: európio para telas de televisão, cério para polimento de vidro e lantânio para catalisadores de motores de combustão.Mas terras raras também podem ser encontradas em drones, parques eólicos, discos rígidos, motores de carros elétricos, lentes de telescópios e jatos de combate. "Alguns desses elementos são mais ou menos insubstituíveis e têm custos elevados", disse Seaman à AFP.
Suas propriedades às vezes são únicas. Por exemplo, as qualidades do neodímio e do disprósio os tornam ideais para a fabricação de ímãs permanentes para turbinas eólicas no mar.
Uma vez instalados, esses ímãs exigem pouca manutenção e oferecem alto desempenho, o que facilita a operação dessas usinas.
China na vanguarda
A China tem uma ampla base de riqueza, mas seu domínio é "o auge de uma política industrial de longo prazo" e "a vantagem obtida com o atraso na regulamentação das indústrias extrativas", afirma Jane Nakano, pesquisadora em Washington do Centro Internacional de Estudos Estratégicos (CSIS).Ao longo de anos de grande investimento público, Pequim manteve uma extensa rede de refino desses materiais, levando muitos países produtores a exportar seus minerais para lá.
A China também tem mais patentes relacionadas a terras raras do que o resto do planeta junto, observa Nakano. Esse domínio foi alcançado ao custo de grandes danos ambientais.
Busca por alternativas
As tensões entre a China e o Ocidente, seja por questões comerciais ou geopolíticas, são diversas. Isso indica uma necessidade urgente de Bruxelas e Washington diversificar seu abastecimento de terras raras.A preocupação tem precedentes históricos: um conflito territorial levou a China a cortar o fornecimento de terras raras ao Japão em 2010. Desde então, o arquipélago asiático diversificou seus fornecedores, fechando um acordo com a australiana Lynas e desenvolvendo uma subsidiária de reciclagem.
Outro alerta foi emitido nos Estados Unidos em maio de 2019. Em meio a uma guerra comercial com Washington, o presidente chinês Xi Jinping visitou uma fábrica de tratamento de terras raras e ameaçou bloquear a exportação desses materiais.
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