Entre os países contrários à captura dos recursos estão Bélgica, Itália, Hungria, República Tcheca e Eslováquia; financiamento será garantido por orçamento da União Europeia
A União Europeia recuou sobre a proposta de utilizar ativos russos congelados no bloco para financiar a Ucrânia, frustrando o plano defendido pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e pelo chanceler alemão, Friedrich Merz.
Após cerca de 16 horas de negociações em Bruxelas, que avançaram pela madrugada desta sexta-feira (19/12), os líderes europeus não conseguiram aprovar o mecanismo considerado mais controverso da agenda, que previa o uso das reservas retidas desde o início da guerra, para sustentar o empréstimo de até € 90 bilhões (R$ 584,7 bilhões) a Kiev.
Diante do impasse, os Estados-membros concordaram em recorrer a uma alternativa provisória: ampliar a dívida comum europeia, com captação nos mercados de capitais, para garantir o financiamento no curto prazo. Segundo o presidente do Conselho Europeu, António Costa, a decisão permite manter o apoio financeiro enquanto “os aspectos técnicos do empréstimo de reparações são resolvidos”.
Merz declarou que “a Ucrânia receberá um empréstimo sem juros de € 90 bilhões (R$ 584,7 bilhões), como sugeri”. Já a presidente da Comissão Europeia explicou que o financiamento será garantido pelo orçamento da União Europeia pelos próximos dois anos, por meio de um empréstimo pan-europeu a juros zero.
O valor inferior é aos € 140 bilhões (R$ 909,6 bilhões) inicialmente previstos no chamado “empréstimo de reparações”. Hungria, República Tcheca e Eslováquia recusaram-se formalmente a participar do financiamento europeu à Ucrânia. Segundo o presidente da Hungria, Viktor Orbán, a decisão representa “um desperdício de dinheiro”.

Bruxelas recua no uso de ativos russos e aprova empréstimo bilionário para socorrer Ucrânia
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Resposta da Rússia
Em coletiva de imprensa nesta manhã, o presidente russo Vladimir Putin comentou a decisão, afirmando que a apropriação dos recursos pode ter consequências graves. “Tomar uma decisão ligada ao roubo de uma propriedade de algum outro país terá um resultado muito negativo no futuro para todos os que participam desse processo. É a destruição de crédito de pessoas e países que roubam o lucro de outros países”, afirmou.
“Além das perdas reputacionais, podem haver perdas diretas que afetem os fundamentos da ordem financeira mundial moderna”, afirmou Putin. “E o mais importante: seja lá o que eles roubarem e de qualquer forma que fizerem, um dia terão que devolver.”
Putin também apontou que a alocação de crédito à Ucrânia com base em ativos russos causará um aumento das obrigações dos países da UE, que já enfrentam problemas orçamentários. “O que significa realmente conceder um empréstimo? Isso afeta o orçamento de todos os países envolvidos porque aumenta a dívida pública, mesmo quando os empréstimos são garantidos por garantias”, afirmou
O diretor-executivo do Fundo Russo de Investimento Direto (RDIF) e representante especial do presidente Vladimir Putin para cooperação econômica, Kirill Dmitriev, celebrou o recuo europeu. “Se for verdade, arquivar o esquema originalmente ilegal proposto pela UE para usar reservas russas no financiamento da Ucrânia é uma grande vitória para o direito e o senso comum — e para as vozes de razão na Europa que protegeram a UE, o euro e a Euroclear”, escreveu na rede X.
Segundo ele, a decisão representou “um golpe poderoso nos belicistas da UE”, liderados por Ursula von der Leyen.
Resistência belga
O primeiro-ministro da Bélgica, Bart De Wever, esteve no centro da resistência ao uso dos ativos russos congelados. Ele foi respaldado por outros líderes europeus, entre eles a primeira-ministra da Itália, Giorgia Meloni, o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, o chefe de governo da Eslováquia, Robert Fico, e o ex-primeiro-ministro da República Tcheca, Andrej Babiš.
A oposição belga refletiu preocupações jurídicas e financeiras. Cerca de € 180 bilhões (R$ 1,1 trilhão) em ativos russos estão depositados na Euroclear, a câmara de compensação sediada no país. Moscou já iniciou um processo de arbitragem contra a instituição e anunciou, durante as negociações em Bruxelas, a ampliação da ação para incluir “bancos europeus”, aumentando o risco para credores do continente.
Em coletiva de imprensa, o premiê belga afirmou: “evitamos entrar em um precedente que corre o risco de minar a certeza jurídica mundial”. E acrescentou “protegemos o princípio de que a Europa respeita a lei mesmo quando é difícil, mesmo sob pressão, e transmitimos um forte sinal político de que a Europa apoia a Ucrânia, permanece unida, age com responsabilidade e ainda importa. Tenho orgulho de termos contribuído para esse resultado sendo construtivos, firmes e responsáveis.”
Ativos seguem retidos
Apesar do recuo na expropriação imediata, a União Europeia deixou claro que não pretende devolver os ativos congelados de Moscou. De Wever afirmou a repórteres que o bloco não tem intenção de liberar esses recursos, e Von der Leyen declarou que qualquer devolução exigiria uma decisão específica da cúpula da UE, a ser aprovada por maioria qualificada — isto é, pelo menos 60% dos países do bloco, representando mais de 55% da população da União Europeia.
A presidente da Comissão reiterou ainda que a UE não considera devolver os ativos à Rússia enquanto Moscou não pagar reparações à Ucrânia que necessita, algo em torno de € 72 bilhões (R$ 467,8 bilhões) para honrar seus compromissos, incluindo um empréstimo do G7, e manter o Estado funcionando.
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