Os mais jovens, gente com cerca de 40 anos, hoje, se acostumaram a ouvir – e não raro a acreditar – que a escaladada violência no Rio de Janeiro se deu a partir do governo de Leonel Brizola, embora o fato de ele ter deixado o governo há um quarto de século já bastasse para mostrar o quanto isso é tolo.

Mas é pior, e bem pior.

Dos arquivos implacáveis de meu amigo Apio Gomes salta a reprodução da capa da Veja de 7 de janeiro de 1981 – portanto, há 37 anos – dizendo que o Rio de Janeiro vivia, naquele longínquo ano uma “Guerra Civil”, assim descrita no seu editorial:

“Ao abrir-se o ano de 1981, os brasileiros que vivem nas grandes cidades, sobretudo Rio de Janeiro e São Paulo, continuam tendo como sua preocupação número um, acima de quaisquer outras, a segurança (…) Certas áreas urbanas do Brasil já se encontram entre as piores do mundo em matéria de criminalidade, superando os mais notórios infernos sociais de que se tem notícia. Pouco a pouco, os hábitos da população vão se alterando em função da violência a que é diariamente submetida (…).

Em nenhum lugar esta escandalosa tragédia brasileira é mais evidente do que no Rio de Janeiro e em suas franjas suburbanas. Não há nada que realmente possa equivaler ao que acontece ali todos os dias. Edifícios inteiros são assaltados. Roubam-se as pessoas dentro dos ônibus que circulam à luz do dia. Criminosos atacam automóveis que param nos sinais de tráfego, ferem e matam suas vítimas, ateiam fogo às suas casas. É raro, na zona sul do Rio, encontrar uma família ou roda de amigos que não tenha tido nenhum de seus membros assaltado. E, pairando sobre tudo, há a incomparável Baixada Fluminense – onde só em 1980 mais de 2.000 pessoas foram assassinadas; algo como uma a cada quatro horas.

É como se fosse uma guerra civil. Na verdade, um princípio de anarquia começa a tomar forma nestas áreas conflagradas, diante do silêncio do Estado. Jamais houve, no país, um problema de seguranças nacional mais genuíno que esse. Jamais tantas pessoas foram tão flagrantemente oprimidas em seus direitos mais fundamentais. Mas, em vez de estar entre as primeiras preocupações do poder, a questão, na prática, está entre as últimas. Após perder o controle sobre as ruas – são os criminosos hoje, que mandam nelas –, o Estado brasileiro parece conformar-se com isso. É uma das marcas mais deprimentes que o país tem a exibir.”

Ao recuperar o texto em um de seus tijolaços, em 1994, Brizola relembra também que, naquela época, ” o Sr. Presidente da República era um general do Exército; o Secretário de Segurança do Rio era outro general; a Polícia Militar do Estado tinha como comandante um coronel do Exército e o regime tinha poder total. Nada resolveram; ao contrário, a violência e a criminalidade só se agravaram.”

Dizem que vão tirar os criminosos das ruas, das favelas, dos bairros. Alguns, sim, verdade, talvez até muitos e certamente nem perto de todos.

A fábrica de criminosos, porém, seguirá trabalhando a todo vapor, com a sua matéria- prima de pobreza, de falta de oportunidades, da carência de uma educação libertadora, máquinas cada vez mais azeitadas pelo ressentimento, pela discriminação, pelo tratamento de gado a passar no brete e ser examinado para saber se tem-se nos quartos a marca a ferro dos antecedentes criminais.

A rosca, o sem-fim, a espiral segue há décadas, com os pobres servindo de combustível para a máquina que moer gente que a todos nos salpica de sangue e de dor.

PS. Se você firmar a vista verá que junto ao pontilhado, à esquerda, Brizola pede que se copie e espalhe o que publicava e, com a nova “xerox” do compartilhamento, este pequeno Tijolaço não se envergonha de pedir o mesmo.

TIJOLAÇO

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