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“O desafio é superar nossas reservas e construir um debate franco e aberto sobre os termos da resistência a Bolsonaro”, dizem o Secretário Nacional de Organização do PSOL e o Secretário Nacional de Movimentos Populares do PT
Por Fábio Nogueira* e Ivan Alex**
Em “Vanguarda e Crise Atual”, de 1990, a intelectual marxista Marta Harnecker utiliza o método de entrevista com dirigentes políticos de esquerda para estabelecer a ideia de vanguarda compartilhada ou coletiva como a unidade de todos os agentes de transformação social. Harnecker propõe, a partir da teoria política marxista, um diálogo entre os que diferenciam vanguarda de conjuntura e vanguarda histórica a partir do diálogo com dirigentes revolucionários latino-americanos. Vanguarda é definida por Harnecker como “força social dirigente” dos processos políticos de transformação social. Logo, vanguarda não se confunde com movimentos sem estrutura que se caracterizariam pela ausência de condução política.
A obra de Harnecker tem como pano de fundo a articulação das cinco organizações (1) que deram origem à Frente Farabundo Martí de Libertação Nacional (FMLN), que, em 1989, chegou a ocupar a capital de El Salvador, mas foi derrotada pela ingerência do presidente dos Estados Unidos, Ronald Reagan. A conclusão de Harnecker, a partir do caso salvadorenho e de outros na América Latina, é que as organizações de vanguarda desenvolvem características próprias a partir da origem social dos seus militantes e do trabalho político que desenvolvem.
Há organizações que construíram seu trabalho entre camponeses, outras entre estudantes e setores de classe média e outras entre os trabalhadores das fábricas e nas cidades. Representam individualmente forças sociais relevantes, mas que não conseguem todos a atividade política nacional e setores sociais. Esta afirmação deriva da lógica materialista e rompe com uma visão idealista de vanguarda e está voltada para as conduções reais do processo político ao invés do somatório de siglas de organizações autoproclamadas revolucionárias.
Quando distingue vanguarda compartilhada e frente política, fica mais nítida a proeminência da vanguarda na condução do processo de transformação global. A frente política é, portanto, algo mais amplo – a exemplo de uma frente democrática e de resistência – em que a vanguarda define a condução real do processo de forma compartilhada – não obstante os demais setores que a compõe não terem a mesma visão de conjunto. Vanguarda compartilhada exige, portanto, mais do que criar frentes – fundamentais e necessárias –, mas estabelecer programas compartilhados de ação de vanguarda, ou seja, de profunda transformação da ordem social e política.
Outra contribuição importante de Harnecker é que vanguarda compartilhada não é sinônimo de fusão entre organizações. Ao contrário, as características que singularizam cada organização podem ser preservadas em nome do acúmulo do trabalho político. O que dá a elas sentido de transformação comum é a articulação de sujeitos sociais reaisem torno de um programa político que estabeleça direcionamento e intencionalidade às suas ações.
Na atual conjuntura do país, vanguarda compartilhada pode ser uma ideia-força que contribua para um maior estreitamento às organizações de vanguarda, partidárias ou não. A unidade política não prescinde da pluralidade da vanguarda e deve ser construída a partir dela. O nosso desafio é, a partir da realidade de cada grupo e organização, superar nossas reservas e construir um debate franco e aberto sobre os termos da resistência a Bolsonaro, recuperando nossas formulações sobre socialismo, democracia e luta popular.
(1) Forças Populares de Libertação Farabundo Martí – FPL, Exército Revolucionário do Povo – ERP, Resistência Nacional – RN, Partido Comunista Salvadorenho – PCS e Partido Revolucionário dos Trabalhadores Centroamericanos – PRTC
*Fábio Nogueira é Secretário Nacional de Organização do PSOL e **Ivan Alex é Secretário Nacional de Movimentos Populares do PT
Revista Fórum

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