"Quem continua ao seu lado não merece perdão. A história saberá condenar cada um deles. Cada um. São todos responsáveis pelo descalabro, pela destruição. São todos desprezíveis", escreve o jornalista Eric Nepomuceno
![]() |
(Brasília - DF, 12/05/2020) Hasteamento da Bandeira Nacional (Foto: Marcos Corrêa/PR)
|
Por Eric Nepomuceno, para o Jornalistas pela Democracia
Nesta terça-feira 12 de maio cumpri exatos 52 dias aqui em Araras, distrito de Petrópolis. Exatas 1.248 horas. Exatos 74.880 minutos.
Lembro de um primeiro de janeiro, há muitos e muitos anos, uns vinte, e do que ouvi de Cacá Diegues ao ligar para deixar um abraço de ano novo. “Eu tenho um desejo de ano novo: que o dia volte a ter 24 horas...”.
Pois é: a partir de uma certa idade, o tempo desanda a voar. E não deixa de voar e voar cada vez mais.
E agora, de repente, o tempo voltou a se arrastar com insólita e terrível lentidão. Tudo soa e parece estranho.
Esta casa, por exemplo. Sempre me pareceu do tamanho exato para ser aconchegante e cálida, e agora de repente ela me parece mínima, de repente ganha ares de imensidão.
E é nessa casa tão minha que recebo notícias arrasadoras, junto com um frio que me acabrunha a vida.
No começo da pandemia, o vírus maldito me lanhou fundo ao levar o grande escritor chileno Luis Sepúlveda. Por respeito à palavra, não digo que éramos amigos. Mas nos conhecíamos há uns 40 anos, e em nossos encontros pairou sempre um ar cálido, o ar dos companheiros de luta e de trincheira.
Depois, o mesmo vírus me acertou duas punhaladas: Luís Edgar de Andrade, jornalista imenso, meu mestre, e dona Leda, viúva de meu bom amigo Cibilis Viana.
E agora, um canhão acertou minha alma: Sergio Sant’Anna, que conheci há 48 anos. Que foi contemporâneo de faculdade da minha companheira, que ao saber que ele se foi para sempre mergulhou numa depressão sem fim. O Sérgio, o Serginho Sant’Anna, que foi solidário e generoso comigo e especialmente com meu filho cineasta, o Felipe.
Como se toda essa dor fosse pouca, vejo o que acontece no meu país, este pobre país náufrago, vilipendiado a cada hora por um genocida desequilibrado, um desqualificado ética, intelectual e moralmente.
Tenho um imenso medo: quando tudo isso tiver passado, qual o tamanho do vazio que terei pela frente?
O vazio deixado pelos amigos levados pelo coronavírus será imenso e permanente, mas por sorte sobrará o calor dos amigos que continuam ao meu lado para suavizar essa sensação.
Meu medo maior é outro: qual será o tamanho do vazio que será deixado neste país destroçado?
Jair Messias não merece perdão. Quem continua ao seu lado não merece perdão. A história saberá condenar cada um deles. Cada um.
São todos responsáveis pelo descalabro, pela destruição. São todos desprezíveis. Lamentáveis.
E ninguém poder sair às ruas para exigir uma limpeza geral é uma sorte deste bando de sacripantas.
Ah, sim: e o silêncio cúmplice, omisso, covarde dos militares aboletados num governo abjeto será cobrado, rigorosamente cobrado, pela história. Pelo que restar deste país que eles ajudam a destroçar.
Brasil 247

Postar um comentário
-Os comentários reproduzidos não refletem necessariamente a linha editorial do blog
-São impublicáveis acusações de carácter criminal, insultos, linguagem grosseira ou difamatória, violações da vida privada, incitações ao ódio ou à violência, ou que preconizem violações dos direitos humanos;
-São intoleráveis comentários racistas, xenófobos, sexistas, obscenos, homofóbicos, assim como comentários de tom extremista, violento ou de qualquer forma ofensivo em questões de etnia, nacionalidade, identidade, religião, filiação política ou partidária, clube, idade, género, preferências sexuais, incapacidade ou doença;
-É inaceitável conteúdo comercial, publicitário (Compre Bicicletas ZZZ), partidário ou propagandístico (Vota Partido XXX!);
-Os comentários não podem incluir moradas, endereços de e-mail ou números de telefone;
-Não são permitidos comentários repetidos, quer estes sejam escritos no mesmo artigo ou em artigos diferentes;
-Os comentários devem visar o tema do artigo em que são submetidos. Os comentários “fora de tópico” não serão publicados;