Para Kesia Rodrigues, regulação prevista para 2026 deve responsabilizar empregadores e mudar cultura de sobrecarga

O ano de 2025 tem revelado uma grave crise de saúde mental no Brasil. O Ministério da Previdência Social registrou 440 mil afastamentos por ansiedade e depressão, o maior número em uma década. Ao mesmo tempo, o custo de vida disparou, a informalidade cresceu e o ritmo de trabalho pós-pandemia nunca desacelerou.
A atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que entraria em vigor no final de 2024, foi adiada para 2026. Ela obriga empresas a adotarem medidas preventivas e de controle contra riscos psicossociais, como metas excessivas, jornadas extensas e assédio moral – problemas que afetam profundamente a saúde mental dos trabalhadores.
A psicóloga e psicanalista Kesia Rodrigues aponta ao BdF Entrevista, da Rádio Brasil de Fato, que “a NR-1 é um marco, que vai instituir a saúde mental como um assunto para o empregador e não só para o empregado. Porque ainda é um tabu muito forte, tanto no micro quanto no macro, de pessoas pedirem licença por questões de saúde mental e de como serão vistas no mercado corporativo”, aponta.
Rodrigues entende que criar uma regulamentação ajudará as empresas a pensarem sobre suas práticas ou revisá-las. “É importante até para começar a ter um diálogo de uma maneira horizontal com aquele funcionário sobre o que o adoece naquele trabalho. E às vezes, né, são coisas básicas, que podem melhorar, como a mudança de um horário, uma folga, férias, entre outros reajustes”, sugere.
A psicóloga destaca ainda que a crise do trabalhador ganhou mais atenção paralelamente a uma busca que tem ganhado força: a luta coletiva pela melhoria da qualidade do trabalho. “Vemos uma grande luta dentro do congresso pelo fim da escala 6×1, que daria uma qualidade de vida melhor para um grande segmento de pessoas. Temos vivido um efeito de trabalho desgastante e desumano, herdado de um passado colonial que se naturalizou no país”, explica.
Segundo Rodrigues, a crise de saúde mental do brasileiro já é demonstrada há anos, porém durante a pandemia os efeitos foram intensificados. A relação do trabalho com as redes sociais “impede que o trabalhador consiga se desligar do seu trabalho”.
“É uma crise pública também, de uma sociedade da performance, que ao mesmo tempo em que adoece devido a um trabalho muito extenuante, ainda acredita que pode fazer mais com seu corpo. Ou seja, adoecimentos como burnout se tornam uma regra, como se todos a qualquer momento da vida fossem desenvolver e ter essa experiência na vida adulta”, contextualiza.
De acordo com a profissional de saúde, o trabalho se tornou primordial na vida das pessoas, de forma que até no momento de lazer “estamos performando”. Essa dinâmica impacta diretamente a saúde mental e é uma das principais causas do seu agravamento.
“Isso se dá porque muitas pessoas acreditam que, para ter um trabalho de alta performance e alta produtividade – garantindo assim seu sustento –, precisam fazer duas ou três vezes mais para se destacar no mercado e manter seu cargo e padrão de vida. A questão é que a cultura do desempenho não tem fim: sempre haverá a ideia de que se pode fazer melhor, ter um corpo melhor, ser mais produtivo. E é aí que entram, muitas vezes, os medicamentos. Temos visto vários medicamentos sendo utilizados para aumento de performance, especialmente no sistema financeiro. É essa crise que estamos enfrentando”, destaca.
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