por Moriti Neto*

Em agosto de 2009, Marina Silva, recém-saída do PT, e um grupo de apoiadores, embarcavam no PV e já diziam: “Chegou a hora de acreditar que vale a pena, juntos, criarmos um grande movimento para que o Brasil vá além e coloque em prática tudo aquilo que a sociedade aprendeu nas últimas décadas, experimentando a convivência na diversidade, a invenção de novas maneiras de resolver problemas solidariamente... Agindo em rede, expandindo e agregando conhecimento sobre novas formas de fazer, produzir, gerar riquezas, sem privilégios e sem destruição do incomparável patrimônio natural brasileiro”. E isso não era de boca, mas parte do documento “Juntos pelo Brasil que queremos – diretrizes para o programa de governo”, que expressava a motivação ao ingressar no partido e que a colocava declaradamente na disputa à Presidência da República nas eleições de 2010.

O projeto, no entanto, teve curta duração. Era 7 de julho de 2011 quando Marina anunciava a desfiliação do PV, onde obteve quase 20 milhões de votos na eleição presidencial. De saída, ela e os apoiadores que a acompanhavam na decisão ressaltavam que a direção do partido “disse não à democratização de suas estruturas institucionais, ao diálogo com a sociedade e a um projeto autônomo de construção partidária”. Na época, se tivesse sido eleita presidente, teria completado apenas pouco mais de um semestre de mandato a bordo da sigla verde.

Lembro que, naquele momento, vieram diversos questionamentos: se Marina tivesse vencido a eleição, sairia do PV? Se sim, governaria como? Abdicaria de filiações partidárias? Como costuraria a base no Congresso Nacional? A ex-senadora se considerava mesmo a figura messiânica, salvadora, que os críticos da personalidade dela apontavam? Se não saísse, ignoraria a descoberta da incompatibilidade declarada com os pevistas e seguiria o governo sem abrir o debate?

O fato é que Marina Silva, sem conseguir ocupar espaços no PV, pedia desfiliação e acusava o partido de não ser o local adequado para as bandeiras que portava. Ancorada na boa capacidade discursiva que possui, ela buscava sustentar a posição, mas não deixava claro como só descobriu, de uma hora para outra, que a mesma agremiação avaliada como ideal para praticar propostas baseadas na “coerência programática” – por ela tão decantada – era, então, imprópria.

E foi na "fundação” do Rede Sustentabilidade, no dia 16 de fevereiro de 2013, num encontro batizado de “Encontro Nacional da Rede Pró Partido”, em Brasília, que aparecia a alternativa de Marina às eleições de 2014. Era na “Rede Pró Partido, mas que não é partido”, que ela, a "diferente", buscava encaixar o discurso da realização da “nova política”.

Em declarações perigosamente despolitizantes e até antipartido, a potencial candidata tentava se autocolocar como “nem de esquerda, nem de direita, nem de centro”. Ao mesmo tempo em que falava de diálogo horizontal com a sociedade, aparecia como a “salvação”. Posturas perigosas à democracia, o que, aliás, eu já observei em texto anterior.

Enfim, eis que Marina Silva, com a recusa da Justiça em legalizar o Rede, vai ao PSB de Eduardo Campos. É a mesma toada. Na campanha, o discurso que clama por um “sistema ideológico” e luta contra o pragmatismo, colocando a candidata como a mais alta defensora do interesse público e das “questões maiores”, a exemplo da rápida passagem pelo PV, quando era o “fator diferente” da corrida presidencial e possibilidade de acabar com o “mais do mesmo” (que realmente é mais do mesmo) do “Fla x Flu” entre PT e PSDB.

Só que, na prática, o que se constata é a ida a um partido de perfil governista-pragmático (o PSB é, ainda, base do Governo Federal e governa com petistas e tucanos em várias estados), entregue a caciques da direita conservadora Brasil afora e que, em momentos decisivos, vacilou no debate de itens fundamentais ao meio ambiente, caso do Código Florestal, tema central na vida política de Marina.

Rumo ao PSB, lá vai a ex-ministra do Meio Ambiente se enfileirar a Bornhausens, Caiado e companhia. Novidade? Não. Somente mais uma reprodução comum do nosso horrível sistema de democracia representativa, onde estão sempre dadas as oportunidades ao desequilíbrio na representatividade da sociedade e à hipocrisia, como a de Marina que, de diferente, não tem nada.


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Moriti Neto, jornalista, repórter e editor-assistente do NR. (Imagem: www.minhamarina.org.br)


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