do LIMPINHO E CHEIROSO
A foto acima foi tirada em outubro de 1988, pouco antes de sua morte. |
No dia 22 de dezembro de 1988, o Brasil perdia uma de suas liderançasmais destacadas, o seringueiro e líder sindical Francisco Alves Mendes Filho, oChico Mendes. Por defender as florestas contra a sanha depredatória em busca delucros, foi assassinado com um tiro de escopeta na porta de sua casa em Xapuri,no Acre, por dois fazendeiros, pai e filho, que foram condenados pelo homicídio.
Dica de AldeiaGaulesa, texto baseado em informações do Terra Azul
Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes, era acreano, nascido noseringal Porto Rico, em Xapuri, no dia 15 de dezembro de 1944. Filho deseringueiro, aos 11 anos de idade já trabalhava ao lado do pai. Sua trajetóriade liderança começa em 1973, quando participou dos conflitos de terra nafazenda Santa Fé, e se expande em 1975, com a fundação do Sindicato dosTrabalhadores Rurais de Brasileia, quando é indicado a secretário geral. Em1976, participa ativamente das lutas dos seringueiros para impedirdesmatamentos e organiza várias ações em defesa da posse da terra.
Aquele era um período difícil para os brasileiros, com o País em plenoregime de ditadura militar e 1977 passaria a ser um marco na vida de ChicoMendes, com a fundação do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri e a suaeleição para vereador, pelo MDB, à Câmara Municipal local. Começam, também, asameaças de morte por parte dos fazendeiros, e as divergências partidáriasporque o MDB não era solidário às lutas dos trabalhadores rurais.
Em 1979, Chico Mendes leva para a Câmara Municipal debates entrelideranças sindicais, populares e religiosas, e, por isso, é acusado desubversão e submetido a duros interrogatórios, sem ter como denunciar asarbitrariedades dos torturadores contra ele e outros presos políticos.
Com o início do processo de “abertura lenta e progressiva” do regimemilitar, em 1980, surge o Partido dos Trabalhadores – PT. Chico, um dosfundadores no Acre, passa à direção do partido naquele estado, participando decomícios na região juntamente com Lula.
Neste mesmo ano, Chico Mendes é enquadrado na Lei de SegurançaNacional, a pedido dos fazendeiros da região que procuravam envolvê-lo noassassinato de um capataz de fazenda que poderia estar envolvido no assassinatode Wilson Pinheiro, presidente do Sindicato dos Trabalhadores de Brasileia.
No ano seguinte, Chico Mendes assume a direção do Sindicato de Xapuri,do qual foi presidente até o momento de sua morte. Nesse mesmo ano, Chico éacusado de incitar posseiros à violência e, julgado no Tribunal Militar deManaus, consegue se livrar da prisão preventiva.
A morte anunciada
Uma onda de violência e impunidade já vinha sendo denunciada por ChicoMendes naquele ano de 1988. Crimes contra líderes sindicais e seringueiros,como aponta a revista Chico Mendes,editada pela CUT/CNS, que não eram apurados:
Em 26 de maio, dois seringueiros foram baleados durante manifestaçõesno prédio do IBDF, em Xapuri, por dois pistoleiros que fugiram de motocicleta.Foram identificados posteriormente por testemunhas, mas o inquérito policialnão acompanhou todos os fatos. As suspeitas recaíram em Darli e Alvarino Alvesda Silva;
Em 17 de junho, o dirigente do Sindicato de Xapuri e candidato avereador do PT, lvair Higino de Almeida, foi assassinado. Os suspeitos foramidentificados como Cícero Tenório Cavalcante e os sobrinhos de Darli Alves daSilva. O inquérito não apurou a autoria do crime;
Em setembro, outro seringueiro foi assassinado no município de Xapuri eapareceram como suspeitos filhos e parentes próximos de Darli e Alvarino. Ocaso não foi apurado;
Ainda em setembro, dois corpos foram encontrados ao lado da casa dasede da fazenda de Darli. Ele próprio comunicou o fato à polícia, que fez osepultamento na própria fazenda sem proceder a investigações. Posteriormente, apolícia fez a exumação dos cadáveres e levou uma equipe médica de Rio Brancopara fazer os exames, visto que os médicos locais se recusaram a atestar a “causamortis”. Os crimes também não foram apurados;
Em 26 de setembro, a Polícia Federal no Acre recebeu carta precatóriaoriginária da Comarca de Umuarama, no Paraná, com o fim de efetivar a prisãopreventiva de Darli e Alvarino. Na tarde de 27 de setembro, Chico Mendestestemunhou a presença de Darli em frente à Polícia Federal. De um hotelpróximo ao local Chico telefonou imediatamente pedindo a prisão de Darli. Nadafoi feito. A carta só foi enviada ao juiz de Direito da Comarca de Xapuri nodia 13 de outubro. Os mandados de prisão foram executados no dia 19 de outubromas os fazendeiros fugiram;
Em 17 de novembro, Chico Mendes denunciou ao juiz da Comarca por carta,que Darli e Alvarino estavam tramando seu assassinato. No mesmo mês e com omesmo teor, ele escreveu carta ao secretário de Segurança Pública, ao GovernoEstadual e ao Superintendente da Polícia Federal;
“Eu tenho consciência de que todas as lideranças populares nessesúltimos dez anos – advogados, padres, pastores, líderes sindicais –, todos elesforam mortos mesmo com garantia de vida do governo. Não precisa nem citarexemplos, pois eles estão vivos na memória de todos. Tenho esperança decontinuar vivo. É vivo que a gente fortalece essa luta. De parte do governo doEstado não tenho por que temer. Pelo contrário. Agora, por outro lado, eu estoudiante de dois inimigos poderosos: a UDR e a Polícia Federal do Acre”, declarouna época Chico Mendes à imprensa brasileira.
Apesar das denúncias, dos pedidos de proteção por parte de entidadesambientalistas, personalidades políticas e dirigentes sindicais, do governadorter colocado dois PMs como segurança, Chico Mendes foi assassinado no quintalde sua casa com um tiro de escopeta, no dia 22 de dezembro de 1988.
Um dia ele afirmou: “Se descesse um enviado dos céus e me garantisseque minha morte iria fortalecer nossa luta até que valeria a pena. Mas aexperiência nos ensina o contrário. Então eu quero viver. Ato público e enterronumeroso não salvarão a Amazônia. Quero viver.”
Impunidade
No dia 15 de dezembro de 1990, quando Chico Mendes estaria completando46 anos de idade, dois dos envolvidos em seu assassinato, Darli Alves da Silva(mandante) e Darci Alves Pereira (autor) eram condenados a 19 anos de prisão.Em 1993 eles escaparam da prisão e foram novamente capturados em 1996. Mas issonão significou o fim da impunidade. Em abril de 2003, o governador do Acre,Jorge Viana (PT) ordenou a reabertura do caso, a pedido do Comitê Chico Mendes.
O primeiro ponto ressaltado pelo Comitê, ao pedir a reabertura do caso,foi o de Jardeir Pereira, o “Mineirinho”, pronunciado no processo como co-autordo assassinato, mas que nunca foi preso. Ele é suspeito de envolvimento com onarcotráfico na fronteira do Acre com a Bolívia. O crime dele prescreverá em 21de dezembro de 2008, pois foi cometido antes da alteração na legislação quepassou a suspender o prazo prescricional em caso de fuga do acusado.
O Comitê Chico Mendes também pediu a investigação do envolvimento daequipe de repórteres do jornal O RioBranco na cobertura do assassinato do sindicalista, no dia 22 de dezembrode 1988. A equipe chegou a Xapuri cerca de uma hora e meia após o crime. Naedição do dia seguinte, o jornal publicou as fotos do corpo do ecologistacrivado de chumbo. A proeza da equipe foi narrada pelo jornal nos seguintestermos: “Informado logo após o assassinato, nossa equipe de reportagem sedeslocou para Xapuri. O editor-chefe César Fialho, o repórter Adonias Matos e ofotógrafo Luís dos Santos seguiram num automóvel Gol. Em uma hora e meiaestavam naquela cidade. Na viagem de ida, apenas um pneu furado.”
Mas a estrada não permitia que a viagem fosse feita em menos de quatrohoras.
Pontos obscuros
A Polícia Militar, que realizava buscas dos possíveis assassinos etinha no seu comando o então sargento H. Neto, sempre chegava com atraso aoslocais onde Darli e Alvarino teriam estado.
O suposto suicídio de uma das mulheres de Darli na sede da fazenda Paraná,antes que prestasse depoimentos ao delegado que investigava o caso.
Comentários ouvidos na sede do Rio Branco F. C., cerca de cinco diasantes do assassinato de Chico Mendes, quando um dos seguranças – possivelmenteo sargento R. Freitas, assassinado algum tempo depois – do então prefeitoAdalberto Aragão, depois de breve conversa com outra pessoa, disse que ChicoMendes duraria talvez mais cinco dias.
Movimentações bancárias e financeiras ocorridas poucos dias antes atédias depois do assassinato de Chico Mendes, para que se pudesse chegar apossíveis “financiadores” do crime. Assim como a compra de parte do seringalCachoeira por Darli Alves da Silva no início do ano de 1988, incluindo a origemdo dinheiro de quem supostamente pagou tal aquisição.
Mais crimes
Darli Alves da Silva, em 2005, atropelou e matou a aposentada MariaFlorência do Nascimento, 71. Ele fugiu para não prestar socorro à vítima. Nãofoi preso por este crime.
Em agosto deste mesmo ano, Darly foi preso pela polícia civil de Brasileia,cidade do Acre, por um mandado de prisão, expedido pela justiça paraense,através de carta precatória, por crimes previsto no art. 121 (homicídio)praticado em 1980 no Pará. Ele tem outros dois mandados em Minas Gerais e noParaná. Em Santarém, também em 2006, Darli foi novamente condenado pelaJustiça. Desta vez, pelos crimes de falsidade ideológica e obtenção definanciamento mediante fraude, conforme documento da Justiça Federal do Pará:
“O réu foi condenado por dois crimes. Um deles, previsto no CódigoPenal Brasileiro, de falsidade ideológica, que consiste em “omitir, emdocumento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou neleinserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita”.O outro crime – “obter, mediante fraude, financiamento em instituiçãofinanceira” – previsto na Lei nº 7.492/86, a chamada Lei do Colarinho Branco.”
“Darli, que em 1991 recebeu a punição de 19 anos de prisão por mandarassassinar Chico Mendes, foi condenado em agosto de 1996, em Umuarama (PR),pelo cometimento em 1973 de um outro assassinato, pelo qual pegou mais 12 anos.Cumpria, portanto, 31 anos de reclusão pelos dois crimes, mas nos últimos doisanos se encontrava em liberdade condicional, benefício a que teve direito apóscumprir parte das penas que lhe foram impostas nos dois julgamentos.”
Sua luta e memória permanecem sempre presentes!
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