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O editorial de O Globo de hoje, 14 de agosto, enquadra o presidente Jair Bolsonaro na categoria de indesejável para o país. Logo no titulo, o vaticínio: “Descontrole de Bolsonaro afeta relações externas”.
Muita atenção à palavra usada para definir o comportamento do presidente Johnny Bravo: descontrole.
Ou seja, está colocado explicitamente o argumento para dizer da incapacidade do presidente eleito para estar à frente do governo.
E prossegue o editorial:
Em relação a Bolsonaro, com um viés positivo, ou seja, silenciando-o e utilizando discurso indireto (o narrador fala por ele) para exatamente evitar que seu discurso bárbaro e torpe influenciasse negativamente o eleitorado. Por muito tempo, tiveram sucesso.
Ao lado dessa linha, utilizou-se também a estratégia da naturalização, humanização de um candidato que, agora descobrem, era “descontrolado”. Por isso, e por vários motivos, o editorial cheira a um grande cinismo.
Prossegue a peça indignada:
Vejamos alguns detalhes:
– No dia da votação pelo impeachment de Dilma Rousseff, o deputado Jair Bolsonaro exalta a memória de um torturador, o coronel Brilhante Ustra, agredindo frontalmente a então presidente.
Isso não merece grande destaque (era preciso tirar Dilma e o PT) e não é retomado durante a campanha (a memória discursiva dos eleitores é constantemente alimentada pela mídia, como em relação a temas específicos como corrupção e inflação. Por que não o fizeram nesse flagrante caso de apologia à tortura?)
– No dia 29 de setembro, enquanto o movimento #elenão ganhava as ruas do Brasil inteiro, o Jornal Nacional trouxe um entrevista com um candidato bonzinho, dentro do avião, voltando para casa após longa internação, com saudades da filha.
– Durante a campanha, as duas candidaturas – Haddad e Bolsonaro – foram tratadas como representantes de dois polos num mesmo campo democrático. As diferenças entre o candidato descontrolado e Fernando Haddad não eram gritantes?
– O silêncio como política editorial envolvia a estratégia de não cobrar propostas do candidato descontrolado. Nada era dito. E isso era “normal”.
– Às vésperas do segundo turno, a Folha de São Paulo traz grande reportagem mostrando como funcionava a fábrica de fake news de Bolsonaro. Isso foi absolutamente minimizado. JN ignorou a questão, depois, fez matérias bem superficiais, apenas reproduzindo o material original.
– Durante a campanha, no Jornal Nacional, Bolsonaro falou ao vivo sobre o kit gay, atribuindo a aberração a uma ação de Fernando Haddad, o candidato do PT, quando ainda era ministro. William Bonner não questionou o teor absolutamente desqualificado da fala do candidato Bolsonaro.
– Depois de eleito, Bolsonaro continuou sendo silenciado positivamente – o JN passou a mostrar apenas imagens do presidente, editando suas falas, que eram reproduzidas por um narrador, ou colocando excertos suaves e não comprometedores. Por que silenciá-lo? Para esconder, quando era conveniente, toda sua ignorância, incapacidade e destempero?
A aposta das forças que construíram e apoiaram Bolsonaro – e foram muitas – , com certeza, era de que o “candidato falastrão” iria se submeter ao núcleo duro do governo, então representados por Paulo Guedes, Hamilton Mourão e Sergio Moro (discursivamente, isso se insinua na frase “pensou-se que moderaria o discurso).
Mas isso não aconteceu, como estamos vendo. Sobretudo, a normalização do agora “descontrolado” presidente era para garantir que a outra força política encampada pelo PT e pela candidatura Lula, que estava muito à frente na preferência do eleitorado, não obtivesse nova vitória.
Ou seja, a eleição de Bolsonaro era o desfecho desejado do impeachment de Dilma Rousseff.
E assim se naturalizou o descontrole, que agora ameaça setores como o agronegócio – pois o embate nas questões ambientais atinge diretamente esse setor, como Haddad havia alertado durante a campanha – e o sucesso das reformas (privatização da educação, reforma trabalhista, fortalecimento dos bancos privados).
Para fechar com chave de ouro o editorial, o veredito final: “O presidente se torna um risco para o país”. Resta saber a qual modelo de país se refere O Globo, pois há enormes lacunas e pontos não explorados na fala editorial do jornal
– que representa a linha das Organizações Globo.
Do ponto de vista da estruturação do discurso e da produção de sentido, há dois aspectos essenciais que devemos buscar compreender neste editorial:
1. Durante todo o tempo, o ataque é à figura do presidente, sujeito uno, que parece ter sido eleito por obra divina (ou do capeta), sem nenhum apoio, sem conjunção de forças, sem defesas inflamadas, sem estrelinhas oportunistas a dizerem da “necessidade de tirar o PT”.
Portanto, infere-se que o inconveniente para o Brasil é apenas e somente Bolsonaro, ele, sujeito individual. Não o seu governo. Bolsonaro é tomado como elemento dissonante, não como aquele que congregou forças para fazer frente à subida de Lula na preferência do eleitorado, mesmo estando injustamente encarcerado.
2. Nada em seu (des)governo é questionado. Nenhuma política nefasta, nenhum sucateamento. Nada. Não há nenhuma menção à recessão, à gravíssima crise econômica que solapa o Brasil, ao desemprego desesperador, aos ataques à educação, aos ataques aos movimentos sociais, aos povos indígenas.
Tudo o que é mencionado como agressivo e prejudicial no presidente “descontrolado” é aquilo que prejudica bancos, agronegócio, o grande capital.
Portanto, repito: querem tirar o descontrolado bode da sala porque ele ATRAPALHA o mercado, ATRAPALHA o agronegócio.
Não é porque ele está levando o país aos caos, disseminado o discurso de ódio, atacando a educação, penalizando os movimentos sociais, dizimando a Amazônia e os povos indígenas.
Nada isso, lembrem-se, interessa ao capital e não vai se tornar pauta da elite com um possível impeachment de Bolsonaro.
Mais do que nunca, “é preciso que tudo mude para que tudo continue como está”.
Muita atenção à palavra usada para definir o comportamento do presidente Johnny Bravo: descontrole.
Ou seja, está colocado explicitamente o argumento para dizer da incapacidade do presidente eleito para estar à frente do governo.
E prossegue o editorial:
“Umas das marcas registradas do deputado e ex-capitão Jair Bolsonaro sempre foi não medir palavras, dando a entender que não pensava antes de abrir a boca em público”.Muito interessante essa constatação. Exatamente por saberem disso e por saberem que o destempero de Jair era um perigo para as aspirações da elite em liquidar Lula e o PT, a tônica editorial das Organizações Globo, Jornal Nacional à frente, foi o silenciamento.
Em relação a Bolsonaro, com um viés positivo, ou seja, silenciando-o e utilizando discurso indireto (o narrador fala por ele) para exatamente evitar que seu discurso bárbaro e torpe influenciasse negativamente o eleitorado. Por muito tempo, tiveram sucesso.
Ao lado dessa linha, utilizou-se também a estratégia da naturalização, humanização de um candidato que, agora descobrem, era “descontrolado”. Por isso, e por vários motivos, o editorial cheira a um grande cinismo.
Prossegue a peça indignada:
“Com 28 anos de mandatos em Brasília, lançou-se ao Planalto sem qualquer chance visível. Continuou falastrão na campanha, venceu as eleições e pensou-se que moderaria o discurso, para se adequar à liturgia e à representatividade do cargo que passou a ocupar”.Acontece que esse traço de “falastrão” foi ocultado durante a campanha. Nunca houve alarde ou grandes matérias mostrando quão destemperado e quão incontrolável e desrespeitoso era o então candidato. Nada foi explorado e enfatizado para a grande massa de eleitores, pelo contrário, todo o destempero ficou bem escondido ou foi minimizado.
Vejamos alguns detalhes:
– No dia da votação pelo impeachment de Dilma Rousseff, o deputado Jair Bolsonaro exalta a memória de um torturador, o coronel Brilhante Ustra, agredindo frontalmente a então presidente.
Isso não merece grande destaque (era preciso tirar Dilma e o PT) e não é retomado durante a campanha (a memória discursiva dos eleitores é constantemente alimentada pela mídia, como em relação a temas específicos como corrupção e inflação. Por que não o fizeram nesse flagrante caso de apologia à tortura?)
– No dia 29 de setembro, enquanto o movimento #elenão ganhava as ruas do Brasil inteiro, o Jornal Nacional trouxe um entrevista com um candidato bonzinho, dentro do avião, voltando para casa após longa internação, com saudades da filha.
– Durante a campanha, as duas candidaturas – Haddad e Bolsonaro – foram tratadas como representantes de dois polos num mesmo campo democrático. As diferenças entre o candidato descontrolado e Fernando Haddad não eram gritantes?
– O silêncio como política editorial envolvia a estratégia de não cobrar propostas do candidato descontrolado. Nada era dito. E isso era “normal”.
– Às vésperas do segundo turno, a Folha de São Paulo traz grande reportagem mostrando como funcionava a fábrica de fake news de Bolsonaro. Isso foi absolutamente minimizado. JN ignorou a questão, depois, fez matérias bem superficiais, apenas reproduzindo o material original.
– Durante a campanha, no Jornal Nacional, Bolsonaro falou ao vivo sobre o kit gay, atribuindo a aberração a uma ação de Fernando Haddad, o candidato do PT, quando ainda era ministro. William Bonner não questionou o teor absolutamente desqualificado da fala do candidato Bolsonaro.
– Depois de eleito, Bolsonaro continuou sendo silenciado positivamente – o JN passou a mostrar apenas imagens do presidente, editando suas falas, que eram reproduzidas por um narrador, ou colocando excertos suaves e não comprometedores. Por que silenciá-lo? Para esconder, quando era conveniente, toda sua ignorância, incapacidade e destempero?
A aposta das forças que construíram e apoiaram Bolsonaro – e foram muitas – , com certeza, era de que o “candidato falastrão” iria se submeter ao núcleo duro do governo, então representados por Paulo Guedes, Hamilton Mourão e Sergio Moro (discursivamente, isso se insinua na frase “pensou-se que moderaria o discurso).
Mas isso não aconteceu, como estamos vendo. Sobretudo, a normalização do agora “descontrolado” presidente era para garantir que a outra força política encampada pelo PT e pela candidatura Lula, que estava muito à frente na preferência do eleitorado, não obtivesse nova vitória.
Ou seja, a eleição de Bolsonaro era o desfecho desejado do impeachment de Dilma Rousseff.
E assim se naturalizou o descontrole, que agora ameaça setores como o agronegócio – pois o embate nas questões ambientais atinge diretamente esse setor, como Haddad havia alertado durante a campanha – e o sucesso das reformas (privatização da educação, reforma trabalhista, fortalecimento dos bancos privados).
Para fechar com chave de ouro o editorial, o veredito final: “O presidente se torna um risco para o país”. Resta saber a qual modelo de país se refere O Globo, pois há enormes lacunas e pontos não explorados na fala editorial do jornal
– que representa a linha das Organizações Globo.
Do ponto de vista da estruturação do discurso e da produção de sentido, há dois aspectos essenciais que devemos buscar compreender neste editorial:
1. Durante todo o tempo, o ataque é à figura do presidente, sujeito uno, que parece ter sido eleito por obra divina (ou do capeta), sem nenhum apoio, sem conjunção de forças, sem defesas inflamadas, sem estrelinhas oportunistas a dizerem da “necessidade de tirar o PT”.
Portanto, infere-se que o inconveniente para o Brasil é apenas e somente Bolsonaro, ele, sujeito individual. Não o seu governo. Bolsonaro é tomado como elemento dissonante, não como aquele que congregou forças para fazer frente à subida de Lula na preferência do eleitorado, mesmo estando injustamente encarcerado.
2. Nada em seu (des)governo é questionado. Nenhuma política nefasta, nenhum sucateamento. Nada. Não há nenhuma menção à recessão, à gravíssima crise econômica que solapa o Brasil, ao desemprego desesperador, aos ataques à educação, aos ataques aos movimentos sociais, aos povos indígenas.
Tudo o que é mencionado como agressivo e prejudicial no presidente “descontrolado” é aquilo que prejudica bancos, agronegócio, o grande capital.
Portanto, repito: querem tirar o descontrolado bode da sala porque ele ATRAPALHA o mercado, ATRAPALHA o agronegócio.
Não é porque ele está levando o país aos caos, disseminado o discurso de ódio, atacando a educação, penalizando os movimentos sociais, dizimando a Amazônia e os povos indígenas.
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Mais do que nunca, “é preciso que tudo mude para que tudo continue como está”.
Viomundo

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